sexta-feira, 6 de abril de 2012

O AZUL DA TARDE

A mansidão de um sol frio
Define em azul a tarde
Que me envolve em lembranças
Cujo tempo pertence
A algum outro eu
Dentro de mim perdido.
Pois sei que sou em tudo
O sopro de um  simples
E provisório agora
que no tardar de tudo
me escapa...

quinta-feira, 5 de abril de 2012

TV, PÓS MODERNIDADE E ROCK

Defendo a tese de que o rock and roll, enquanto sub cultura urbana, característica que lhe aproxima e afasta do jazz, considerando o papel sócio cultural deste ultimo nos anos 20 e 30 nos USA, contou para sua construção enquanto  cultura social,  definitivamente com as possibilidades e recursos estabelecidos por  certas inovações tecnológicas que transformaram significativamente o imaginário e hábitos culturais no contexto da sociedade massificada do pós guerra.
Penso particularmente mais na difusão da cultura televisiva do que propriamente na radio difusão que fora essencial ao rock dos anos 50, mas limitada para as codificações  do cenário social e industrial do rock, principalmente, a partir dos anos 70.
Uma singular passagem de AS ORIGENS DA PÓS MODERNIDADE de Perry Anderson parece corroborar minha tese:

Comercializada a partir dos anos 50, a televisão só adquiriu importância maior nos anos 60. Mas enquanto a imagem era só em preto e branco, o veículo manteve uma marca  de inferioridade apesar de suas outras vantagens, como se fosse ainda uma enteada atrasada do cinema. O verdadeiro momento de sua ascendência só veio com a chegada da televisão em cores, que se generalizou no Ocidente no inicio dos anos 70, desencadeando uma crise  na industria cinematográfica, que ainda sofre os efeitos nas bilheterias. Se há um isolado divisor de águas tecnológico do pós moderno, ei-lo. Se compararmos o cenário que criou àquele do inicio do século, a diferença pode ser captada de forma bem simples. Outrora, em jubilo ou alarmado, o modernismo era tomado por imagens de máquinas; agora, o pós modernismo é dominado por  máquinas de imagens. Em si mesmos, o parelho de televisão e o terminal de computador  com que eventualmente se fundirá são objetos peculiarmente vazios-zonas nulas dos interiores domésticos ou burocráticos que não apenas são incapazes como “condutores de energia psíquica” como tendem a neutraliza-la. Jamenson constatou isso com uma força que lhe é característica: “essas novas máquinas podem se distinguir dos  velhos ícones futuristas de duas formas interligadas: todas são fontes de reprodução e não de ‘produção’ e já não são sólidos esculturais no espaço. O gabinete de um computador dificilmente incorpora ou manifesta suas energias  específicas da mesma maneira que a forma de uma asa ou de uma chaminé”
Por outro lado, embora tenham imagens resistentes, as máquinas despejam uma torrente de imagens  com cujo volume nenhuma arte pode competir. O ambiente técnico decisivo do pós moderno  é constituído por essas “cataratas de tagarelice visual”.

Perry Anderson. As Origens da Pós- Modernidade. Tradução: Marcus Penchel, RJ: Zahar, 1999, pg. 104/105   

Diferente do autor, que nenhuma virtude percebe nas novas codificações do real inauguradas pela cultura televisiva e, posteriormente, pelo computador, creio que as novas codificações do real introduzidas por tal cultura foram fundamentais para transformar nossa imagem de mundo, complexibiliza-las de um modo inédito. A proliferação de imagens, o imediatismo de sua  experiência direta, transformou e transforma ainda hoje sensibilidades... Ver os Beatles ou os Stones na TV foi ao longo dos anos 60, ou Led Zeppellin e Black Sabath nos anos 70, só para dizer alguns exemplos, uma “novidade” na época sem qualquer procedente. Questão que espero posteriormente aprofundar.
  

segunda-feira, 2 de abril de 2012

DESENRAIZAMENTO E NOMADISMO NA CULTURA CONTEMPORÂNEA

A cultura contemporânea tem como um de seus mais acentuados traços certa tendência ao “nomadismo”, expressão que aqui nada tem a ver com a pratica arcaica de sociedades primitivas europeias de coletores-caçadores, cuja busca de alimento condicionava a um deslocamento constante . Entendo por nomadismo uma condição cultural que se confunde com aquilo que Hannah Harendt em suas ORIGENS DO TOTALISMO e na CONDIÇÃO HUMANA definiu como um desenraizamento ou alienação dos homens com relação ao mundo vivido.

Desconsiderando as reflexões da autora sobre o significado de tal desenraizamento na esfera pública, quero chamar atenção para suas implicações sobre a vida privada, sobre o micro universo da experiência individual.

É justamente por isso que proponho aqui uma livre utilização do conceito de “nômade”. Sua pertinência reside no fato de que, em certas tendências do ethos que define a contemporaneidade, já não habitamos confortavelmente personas, nem se mostra muito eficiente o artificio social de qualquer identidade coletiva ou papel social. As próprias paisagens cotidianamente vividas já não nos habitam ou nos conferem uma satisfatório abrigo a existência.

Estamos todos hoje cada vez menos comprometidos com qualquer suposta “objetividade” do real, cada vez mais mergulhados no hibridismo de conceitos, mundos e experiências. O que Harendt percebia como “desenraizamento” , como um deslocamento ou alienação do mundo do campo da experiência cotidiana, revela-se a luz do nosso mais imediato agora, como um novo modo de se “estar no mundo”, um “mundo” que já não tem limites, que é cada vez mais virtualmente definido pelas metáforas e metamorfoses de seus símbolos e signos, pela inflação dos significados... Um mundo onde “desenraizar-se” é pertencer a tudo e a nada como efêmera presença.

sexta-feira, 30 de março de 2012

VIRTUAL FUTURO


Habitarei palavras
Ao sabor
De cada instante
Que me consome
Em ansiedades
E pensamentos
De futuros
Que jamais se farão
Presentes.

Sei que viver é um ato
Virtual e provisório
Que nos transcende
No acontecer das coisas
Através da gente...

quinta-feira, 29 de março de 2012

PUER AETERNUS


Estamos  todos
Um pouco
Cada vez
 Mais velhos,
Cada vez mais outros
De nós mesmos.
Entretanto,
Se nos transforma o corpo,
Cada vez mais jovem
E inquieto
Me transforma o pensamento...

quarta-feira, 28 de março de 2012

PARA ALÉM DOS ANOS E DIAS DO CALENDÁRIO

Estamos todos
Exatamente agora
Compartilhando
Um mesmo horário
E dia de calendário...
Mas quão diversa é a experiência
Das horas pessoalmente vividas
Dentro de cada um de nós!

No mais domestico plano
Dos acontecimentos cotidianos
Cada um  vive seu próprio
E biográfico tempo
Contrariando o calendário
E a métrica dos anos.

O dia de hoje
Não foi ,
Em poucas palavras,
o mesmo
Para qualquer um de nós...

ALIENAÇÃO REDENTORA


Tudo que me acontece agora
Aqui dentro da sala
Pouco iluminada
Em janela fechada
É escutar o suave som da chuva
Caindo lá fora
Como se a noite simplesmente
Não existisse nos atos gratuitos
Das coisas
Em que o mais concreto e elementar da vida
Fere a realidade no radical da matéria
Vestindo de sonho
O mais elementar dos atos...

IMPESSOALIDADE

As pessoas seguem



Aleatoriamente


Em todas as direções


No fosco da multidão.






Cada um carrega em silêncio


Seu próprio destino


Na trama universal da condição humana,


Sua incomunicabilidade,


Seu mais intimo sentimento das coisas


E do caos


Sem perceber o quanto


Em sua máxima singularidade


Realiza apenas o mais elementar


E comum do humano...

quinta-feira, 22 de março de 2012

NOTA SOBRE MENTE, CORPO E CONDIÇÃO HUMANA

É bastante usual atribuir-se a mente a condição de "essência” da condição humana. Mas o que exatamente entendemos por mente é algo ainda bastante nebuloso.

De um modo geral, poder-se-ia definir a mente como o conjunto de funções superiores do cérebro humano, o que remete a nossa capacidade de reflexão e consciência das coisas. Mente torna-se, assim, quase um sinônimo para pensamento.

Faço questão de frisar que a superposição entre atividade mental e atividade cerebral, contrariando o antigo dualismo de inspiração religiosa que deduzia do conceito de mente a noção abstrata de “alma”, parece-me hoje uma premissa elementar para qualquer debate minimamente relevante sobre a natureza daquilo de nomeamos “mente”.

Deve-se também ser descartada certa exagerada valorização do “subjetivo” ou do papel da consciência do eu na definição dos processos mentais.

Afinal, mesmo que de modo ainda inconclusivo, as descobertas neuro cientificas apontam cada vez mais para a complexa e dinâmica arquitetura cerebral como o lugar da mente; lugar este cujo conhecimento ainda é, de modo muito desconcertante, parcial. O que não invalida o fato de que nada nos indica a possibilidade de buscar a mente em outro lugar (ou em algum descabido não lugar) que contrarie o “bom senso secular”.

O que aqui quero ressaltar, entretanto, são as implicações disso que, se me permitem cunhar a expressão, poderíamos chamar precariamente de uma fundamentação cada vez mais biológica da mente no modo como configuramos a condição humana.

Neste sentido, um processo pouco refletido em si mesmo, mas que bem caracteriza entre outros traços a cultura contemporânea, é a forma como cada vez mais uma consciência da dimensão física, do dinamismo de nossos corpos, influencia a definição de nossa auto imagem, auto consciência e hábitos cotidianos.

A difusão da prática de exercícios físicos e dietas são os sintomas mais superficiais desta tendência cultural que abarca de modo mais amplo um envolvimento maior com nosso corpo integrando-o concreta e simbolicamente a referência do EU de modo radical.



ESTRADA ABERTA

Sei paisagens



Passando por mim


Agora


Enquanto leio


A estrada aberta


Que a lugar algum


Me leva.



Estou em todas


As coisas


De passagem,


Sempre seguindo


Em frente,


Na urgência do sem nome


Do mais intenso sentimento


De vida e liberdade...