sábado, 5 de março de 2022

O ENÍGMA DA MORADIA

A moradia é o lugar  do corpo no mundo. É a vida como duração e memória de experiências entre geraçöes. Logo, também é devir e mudança, ou, simplesmente, descontinuidade.
O morar nunca é sedentário. Ele acontece mais no tempo do que no espaço,  enquanto consciência e valoração de vivências e cotidianos.
Desta forma, é preciso desespacializar a moradia e habitar o tempo, re-significando a geografia de nossas vidas. Morar é saber-se corpo e natureza, é não caber realmente em parte alguma da realidade do mundo.

sexta-feira, 4 de março de 2022

NATUREZA E NIILISMO

Despida da máscara da verdade,
a vida se revela intensa
 experiência do desrazoável das coisas.
Há somente a vertigem das sensações, 
o movimento das afeições
transbordando imaginações.

Cada objeto se faz sujeito de alguma imagem pensamento
que  conduz ao estranhamento
de um mundo que através de cada coisa
se apresenta inédito, 
que se faz outro através do corpo
que redescobre o vento.
A vida se reduz assim
a natureza nua que nos desperta
para uma nova infância.



O ENIGMA DA FLOR

A flor dura apenas alguns dias em um jardim que nunca é o mesmo. E nós, que nos julgamos mais complexos do que uma flor, cultivamos a ilusão de que nossos anos escapam a natureza, que valém mais do que  a eternidade desfeita em um dia de jardim.

quarta-feira, 2 de março de 2022

NO MUNDO DA INFORMAÇÃO

Os olhos cansados diante da tela
já não passeiam mais.
Mal sabem percorrer o texto
cujo sentido se esvai em informação. 
Texto que é seguido de outro,
no desfile de um dizer banal,
como degradadas paisagens perfeitas
de qualquer comercial.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

O HOMEM VERDE

Visto o verde musgo
das pedras 
que dialogam com o rio.
Existo entre a terra e o mar
ao sabor do vento
sem o peso de estar
em qualquer lugar.
A natureza ensina a beleza
de uma vontade dispersa
que ignora o querer
e sabe sonhar.
Vestido de verde
vivo o encantamento do mundo
entre os animais selvagens. 

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

SOBRE O PASSAR DOS ANOS

Sofremos os dias que nos inventam
como se as horas
fossem palavras já ditas, 
escritas em nossas rotinas,
e o futuro fosse feito de algumas  certezas.
Mas nenhuma verdade
nos revela os anos.
Tudo é sempre novo e desconhecido.

A vida e o tempo nunca envelhecem,
ao contrário dos nossos corpos
e dos nossos dias
que quase nunca
suportam memória.

sábado, 19 de fevereiro de 2022

OS DOIS LADOS DA PALAVRA

O lado de dentro da palavra é a vida. Vida que quando não é dita ou escrita, escapa através do silêncio que nos devora.

O lado de fora da palavra é a escuta que nos transforma
reinventando a vida que nos cala
e aos poucos vai embora.


quinta-feira, 17 de fevereiro de 2022

O SENTIDO DO SILÊNCIO

Refugiados em alguns discursos, buscamos abrigo contra a perplexidade que nos obriga ao silêncio.
Mas é um esforço inútil...
Lutamos contra a indeterminação de um luto universal
que denuncia nossa carência ontológico, nossa falta de mundo, que desfaz o sentido de qualquer palavra.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

SENSIBILIDADE BARROCA

No labirinto barroco das oposições,
luzes inventam sombras,
na vertigem de ermas alturas.
Tudo é incerteza e evasão,
na angustia da distância,
nos abismos da imaginação,
na fome crua de redenção,
entre a sensualidade e o inatingível.

domingo, 13 de fevereiro de 2022

O RIDÍCULO DA MODERNIDADE

A modernidade, com seus saberes e disciplinas, com sua razão pudica, reduziu o homem a um animal doméstico.
O industrialismo e a mercantilização da vida tornarnaram,  no mínimo, ridícula a declaração dos direitos universais...
A metanarrativa de uma razão emancipadora e tecnicista nos conduziu a domesticação das consciências e ao controle estatistico dos corpos, agora reduzidos a triste categoria de população.
A disciplina da educação e do trabalho fez do "cidadão republicano" um bichinho adestrado e dedicado a mera sobrevivência, resignado aos poderes que o atravessam na produção de sociabilidades e razões de Estado.