terça-feira, 17 de março de 2020

VIDA QUE SEGUE

E a vida  coletiva segue,
Sempre a sombra de alguma tragédia,
Na expectativa de qualquer catástrofe,
De um merecido fim da humanidade.

O futuro, entretanto, nunca chega
E a gente, aos poucos,
Desaparece,
Enquanto a vida coletiva segue,
acumulando ruínas. 

segunda-feira, 16 de março de 2020

ARTE E TRANSCENDENCIA


A experiência artística pressupõe uma espécie de apagamento do eu, um estado de indistinção entre sujeito e objeto, onde a imaginação  transcende os sentidos e o pensar corrente. 

A arte realiza o assombro do extraordinário, a transfiguração  do instante e , como tal, nos oferece um vislumbre de morte, um estranhamento da vida.

Evadir-se, desdizer a própria existência através  da obra, é  o que persegue um artista na materialização do virtual, do que não  cabe na realidade.

Escapar ao eu e ao mundo através da experiência da criação abranda nossa insignificância, nos concilia com o não  ser.  O ato criativo permite uma privilegiada intuição do nada que nos faz rascunhar o ilegível de nossa ordinária existência.

A arte não busca o belo, o ideal, mas a intuição sublime  do caos.

quarta-feira, 11 de março de 2020

NOVA BABEL



Onde os ouvidos não falam diferentes línguas,
as palavras desconhecem diálogos 
e escutam apenas seu próprio eco.

Elas circulam mudas e surdas no cotidiano comércio das letras
Reinventando Babel 
entre os ditos e escritos que encantam os rebanhos e seus livros da lei. 

Assim,
como hoje e sempre, a moral contamina todos os enunciados
e cada qual em seu canto de fala 
Toma como verdade o ridículo do seu próprio ditado,
seu caricato enunciado de  poder,
seu intimo delírio de razão universal,
em meio a decadência dos fatos e do real. 

Mais do que nunca é preciso inventar uma nova língua
e um novo povo contra a terra antiga.

CIVILIZAÇÃO EM TRANSIÇÃO



É tempo de precariedade,
de vida danificada,
de perguntas sem respostas,
Sedentarismos e rebanhos.

Tempo raso de desertos
e transições,
de desenraizamentos e negações.

É tempo de sem tempo,
de metamorfoses e enigmas
na agonia das imaginações
que implodem fatos e tradições.


A ARTE DO PENSAMENTO



Pensar foi para mim
Não compreender,
Desdizer humanidades.
Ser na exterioridade das coisas,
Saber vertigens e angústias
Na intuição  do não  ser.

Pensar, afinal, é sempre  devir,
Indeterminação e ausência,
Na composição dos silêncios 
Que definem uma existência
Na angústia de ser.

segunda-feira, 9 de março de 2020

A ESCOLA CONTRA A VIDA


A escola nos rouba a imaginação, 
Envenena a vida com disciplinas,
Metas e saberes abstratos
De fria e estéril razão. 

A escola  nos impõe 
Qualquer ideal
De inteligência pós  artificial
Arranca-nos a alma,
No adestramento para o progresso,
Para o futuro da sociedade pós  industrial. 

A escola devora tudo que é humano,
Toda nossa angústia,
Nos impondo o dizer verdadeiro
De nosso silêncio produtivo e mecânico 
Reduzindo toda forma de expressão 
A qualquer estratégia de conformismo.



domingo, 8 de março de 2020

REDEFININDO A INFÂNCIA


A infância não  é  um tempo do corpo,
Mas um estado de consciência, 
Onde a fantasia inventa a vida
Na intensidade do afeto
Que encanta o mundo.

A infância é uma redescoberta constante
Do eu e das coisas 
Através  da imaginação. 
É a vida como liberdade,
Devir e criação,
Um permanente processo de mudança
e fabulação. 






quinta-feira, 5 de março de 2020

DIVERSIDADE E DEVIR


"Nada é permanente, salvo a mudança."
Heráclito

A composição e decomposição dos corpos define a inconstância do existente, sua indeterminação. A mudança aqui, entretanto, não intenta um outro, o novo, mas o movimento cego como premissa da própria condição do existente além da ilusão da identidade e da duração.

Mudança aqui não serve a qualquer propósito teleológico, mas a paradoxal identidade daquilo que não é, que se afirma pela negação e pela imprecisão, levando ao limite qualquer relação ou dialogo entre as coisas que se apresentam a como fixas e estáveis em uma espacialidade orgânica (cosmos).

A mudança, como inconstância e indeterminação, é aquilo que nos diz que nada é no sentido de nossa percepção. Aquilo que é difere de si mesmo e se realiza como criação de si mesmo através da diferença, não como negação, mas afirmação do diverso.

MEMÓRIA


Tempo não é memória,
mas perda e esquecimento.
Memória é corpo,
reconhecimento,
afeto,
que desafia o tempo.

Através da memória
nos reconhecemos
uns nos outros
na experiência do quase nada
de qualquer identidade temporária.



quarta-feira, 4 de março de 2020

SIMPLICIDADE


Não serei apêndice de qualquer discurso,
de nenhum dizer verdadeiro
com fome de realidade.
Escutarei os silêncios
que me invadem o corpo
nos gestos pequenos
de simples e cotidiana sobrevivência.