sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

A ROTINA PELO AVESSO

Respiro um descartável céu azul
Na gratuita manhã
Que me impõe a vida.

Sei de antemão
o dia que terei...

Mas pequenos fatos visitam-me
Como uma brisa fresca
No calor da rua
Sussurrando o imprevisível....

Apreendo o nada
Que será
Amanhã

domingo, 30 de novembro de 2008

RELIGIÃO PESSOAL: A EXPERIÊNCIA ARCAICA DO SAGRADO E O INDIVIDUO CONTEMPORÂNEO


A experiência subjetiva do sagrado é de fato uma das formas como a psique objetiva se revela na experiência singular de um indivíduo. Como já havia percebido WILLIAM JAMES, o sentimento religioso é uma entidade mental multifacetada que se revela de modo autêntico e profundo enquanto assimilação pessoal e singular de pensamentos e sentimentos.
Em suas próprias palavras

“Num sentido, pelo menos, a religião pessoal se revelará mais fundamental do que a teologia ou o eclesiasticismo. Depois de estabelecidas, as igrejas passam a viver de uma tradição de segunda mão; mas os fundadores de cada igreja deveram o poder, originalmente, à sua comunhão direta e pessoal com o divino. Não somente os fundadores sobre- humanos, o Cristo, o Buda, Maomé, mas todos os instituidores de seitas cristãs estão nesse caso; de modo que a religião pessoal deve ainda parecer primordial até aos que continuam a julga-la incompleta.
(...)
A religião, por conseguinte, como agora lhes peço arbitrariamente que aceitem, significará para nós os sentimentos, atos e experiências de indivíduos em sua solidão, na medida em que se sintam relacionados com o que quer que possam considerar o divino. Uma vez que a relação tanto pode ser moral quanto física ou ritual, é evidente que da religião, no sentido em que a aceitamos, podem brotar secundariamente teologias, filosofias e organizações eclesiásticas
.”[1]

A “religião pessoal” caracterizada pelo autor, da qual a alquimia medieval, com as devidas reservas pode ser interpretada como um dos seus mais relevantes exemplos, pressupõe um estado de espirito onde a “ilha egóica” é transcendida pelo “continente inconsciente”. O arrebatamento pela intuição do infinito conduz a realidade psicológica do invisível, a experiência “redentora” do self que, devo dizer, vai muito além da cristalização de qualquer dogma ou da adesão mecânica a uma “comunidade do espirito”. Trata-se obviamente de uma gnose ou de uma opus.
Inspirando-me em JUNG, diria que a aventura espiritual do nosso tempo consiste na entrega da consciência ao indeterminado e indeterminável da psique. Esta é por natureza uma experiência pessoal na qual o indivíduo confronta-se involuntariamente com as representações primordiais da alma coletiva. Ela compreende, em outras palavras, a busca e realização em cada pessoa de uma individualidade psicológica, a uma auto descoberta de si mesmo como totalidade e unicidade.
Assim como através do corpo introjetamos psicologicamente o mundo exterior e físico, através de nossas fantasias religiosas, sejam laicas ou sacras, apreendemos o mundo interior da psique. Como conclui WILLIAM JAMES:

“ Segundo a minha maneira de ver, o modo pragmático de considerar a religião é o mais profundo. Dá-lhe corpo assim como lhe dá alma, fá-lo reivindicar para si, como tudo o que é real precisa reivindicar, algum reino característico de fatos. O que são os fatos mais caracteristicamente divinos, independentemente do influxo real de energia no estado de fé e no coração, não sei. Mas a super crença à qual estou pronto para aventurar-me pessoalmente é que eles existem. Toda a corrente da minha educação tende a persuadir-me de que o mundo da nossa consciência presente é apenas um dentre os inúmeros mundos de consciência que existem, e que esses outros mundos devem conter experiências providas também de um significado para a nossa vida; e que embora tais experiências e as experiências deste mundo sejam discretas, em certos pontos se tornam contínuas, e energias mais elevadas filtram-se até nós.”[2]

O mundo da consciência demarcado pelo pensamento religioso, desde a decadência da influência da Igreja Católica de Roma sobre a cultura ocidental, pode-se dizer, iniciada com as heresias do século XII, consolidada com a Reforma Protestante e recentemente complementada pelo refluxo de todas as religiões institucionais frente ao desafio do deslocamento da identidade do indivíduo, tema corrente entre os autores ditos “pós-modernos”, parece apontar para afirmação crescente da religiosidade como uma experiência cada vez mais pessoal e subjetiva. O protestantismo e posteriormente o esoterismo do século XIX, cujas marcas são claras na poesia de um Baudelaire, de um Gerald de Nerval ou de um Willian Blake, anunciam inequivocamente uma profunda transformação do relacionamento existente entre o indivíduo e o sagrado cujas proporções não podem ser esgotadas neste breve ensaio. Não seria, entretanto, precipitado toma-la como uma possível redescoberta do indivíduo e redimensionamento da consciência do coletivo. Falar sobre isso significaria, entretanto, extrapolar os limites da ciência e mergulhar no pântano escuro das especulações subjetivas, caminho que aproximaria as ciências humanas da categoria de arte, de criação.

[1] William James. As variações da experiência religiosa. Um estudo sobre a natureza humana. SP: Cultrix, 1991, p32.
[2] Ibidem , p. 320.

LOVE


“Tudo me gira em torno.
A expectativa me faz sentir
Vertigens.
O deleite imaginário é de tal modo
Doce
Que me encanta os sentidos”

Shakespeare. Tróilo e Cressida.
III : ii


O amor se faz em sangue
E carne
No buscar ingrato do desejo
Pelo outro de si mesmo.

É um jogo estranho
Entre presença,
Ausência
E eternidade
Em aprendizados de alteridades.

O amor é um encontro
De duas bélicas vontades
Na intensidade da vida
E encanto de naturezas.

ACROSS THE RAIN

As inércias de um dia chuvoso
Decoram os pensamentos,
Inspiram magias.

Deixo-me estático
Entre ruínas de memória
E rascunhos de futuros abandonados
Vislumbrando horizontes perdidos.

Deito-me sobre a chuva
E esqueço-me em sua música
Como quem sabe
Todo futuro da humanidade.

I felt weak.
I could no longer stand.
It’s late.
I am tired...

I fell...

PRAZER E CONTEMPORÂNEIDADE: O IMPERATIVO DO TEMPO PRESENTE


Independente do seu status social, no mundo contemporâneo cada indivíduo está em maior ou menor medida predisposto a buscar aquele estranho estágio de realização pueril de pequenos prazeres que, na falta de palavra melhor, chamaria de “boa ou doce vida”.
A economia dos prazeres diários tornou-se realmente um dos mais significativos aspectos do comportamento humano a ponto de moldar a face de qualquer centro urbano, mesmo que de médio porte.
Através de restaurantes, lojas de departamento, motéis, locadoras de vídeo, cinemas, etc. desenha-se uma verdadeira geografia dos pequenos prazeres das quais absolutamente não se pode escapar. Até mesmo os ambientes domésticos e públicos são cuidadosamente moldados para ser “confortáveis”, produzir “relaxamento”, funcionalidade , ou em outras palavras, despertar prazer.
A onipresença e onipotência do prazer é algo de que absolutamente não se pode duvidar na medida em que já nos tornamos conscientes de que o desejo é a premissa elementar de nossa condição humana.
Em outras palavras, ser é desejar, é existir através dos múltiplos objetos de um querer permanente e sem limites que jamais será plenamente satisfeito.

A desconstrução das antigas metafísicas que sustentavam uma imagem de mundo fundada em referencias de ordem, morais universais e teleologias totalitárias de significados , pressupôs a ascensão do imanente, do “concreto imediato” e do efêmero ao centro de nossas consciências de mundo e realidade. Agora vivemos radicalmente em função do presente e seu sensualismo mas do que dos sonhos infantis de eternidades.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

KLAXONS: MYTHS OF THE NEAR FUTURE


http://www.myspace.com/klaxons


Lançado em Janeiro de 2007 'Myths Of The Near Future', primeiro álbum do Klaxons, uma das melhores bandas inglesas surgidas nos últimos tempos, já pode ser considerado um verdadeiro clássico do rock.
O trio londrino, formado por Jamie, James e Simon em 2005 e cuja carreira despontou com o single Gravity's Rainbow", revelando uma musicalidade profundamente original e uma imagética neo psicodélica. Nada surpreendente para uma banda que definitivamente reinventou a musica eletrônica e o velho rock’roll no Reino Unido.
O significado do nome da banda é bastante curioso. A palavra Klaxons significa “Buzina de automóvel” .Vale lembrar que a primeira revista modernista a ser publicada no Brasil adotou tal nome e as seguintes palavras do editorial do seu primeiro número, com as devidas adaptações, serviria muito bem para inspirar apresentações dessa fascinante banda britânica meta psicodelica:

"Klaxon sabe que a vida existe. E, aconselhado por Pascal, visa o presente. Klaxon não se preocupará de ser novo, mas de ser atual. Essa é a grande lei da novidade.(...)Klaxon sabe que o progresso existe. Por isso, sem renegar o passado, caminha para adiante, sempre, sempre. (...) Klaxon não é futurista.Klaxon é Klaxista.(...)Klaxon cogita principalmente de arte. Mas quer representar a época de 1920 em diante. Por isso é polimorfo, onipresente, inquieto, cômico, irritante, contraditório, invejado, insultado, feliz."

DELICADA QUIMERA


Todo tempo é futuro
Entre lutos e urros
No crepúsculo
De passados mudos
E ilusões de pensamento.

È ao por do sol
Que os amanhãs se reinventam
Para nutrir a noite
Embalando alvoradas incertas
Dentro de um tempo entre aberto.

Mudanças são
Como crianças inquietas
Vestidas de esperança
Sobre um céu desperto.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

LITERATURA INGLESA XXXIX


“Os conceitos da vida e do mundo que chamamos "filosóficos" são produto de dois fatores: um, constituído de fatores religiosos e éticos herdados; o outro, pela espécie de investigação que podemos denominar "científica", empregando a palavra em seu sentido mais amplo. Os filósofos, individualmente, têm diferido amplamente quanto às proporções em que esses dois fatores entraram em seu sistema, mas é a presença de ambos que, em certo grau, caracteriza a filosofia.”


Bertrand Russel- A Filosofia entre a religião e a Ciência in História da Filosofia Ocidental


Nascido no País de Gales, o filósofo Bertand Russel (1872-1970) merece sem sombra de duvidas um lugar privilegiado em qualquer panorama da literatura de língua inglesa. Não por acaso recebeu o Nobel de literatura em 1950. Embora consagrado no campo da filosofia pelos seus estudos sobre lógica e matemática, ao lado do amigo Aldous Huxley, Russel foi antes de tudo um grande ensaísta e humanista, um típico intelectual do século XX, ou seja, um escritor profundamente atento aos problemas e desafios do seu tempo e embalado por uma demasiada confiança na racionalidade humana. Fato comprovado por sua militância anti-nuclear em tempos de guerra fria inspirada por sua vivencia da barbárie de duas guerras mundiais.
Pretendo aqui apenas comentar um de seus ensaios ainda hoje mais populares: What I Believe.

Alan Ryan, professor de ciências políticas e diretor do New College da Universidade de Oxford, nos oferece na apresentação que faz a obra a seguinte e esclarecedora contextualização:

“ No que acredito foi inicialmente publicado em uma série de livros muito curtos- os editores os chamavam de “panfletos”- intitulados “Today and Tomorrow” ( Hoje e Amanhã). Eram livrinhos sobre assuntos os mais variados: “o futuro das mulheres, guerra, população, ciência, máquinas, moral, teatro, poesia, arte, musica,sexo, etc.” Dora Russel escreveu Hypatia para defender a libertação das mulheres, e Russell escreveu dois panfletos para série, dos quais No que acredito foi o segundo. Dedalus, de J.B.S. Haldane, havia oferecido uma visão otimista do que a ciência faria pela humanidade no futuro; Hussell replicou com Icarus, para mostrar que o filho de Dédalo, aprendeu a voar, mas não a voar de um modo inteligente. Já que a ciência enquanto fruto da inquirição racional do mundo poderia apenas nos dizer como atingir nossos objetivos, era de se esperar que o mais impressionante resultado do avanço científico seria transformar a guerra em um massacre de proporções globais. Se evitássemos tal destino, nós nos veríamos ou entediados à morte- na medida em que a burocracia em larga escala tomou as rédeas do mundo- ou seriamos transformados nas dóceis criaturas imaginadas no Admirável Mundo Novo de Huxley- livro provavelmente inspirado pelo Icarus de Russel-, geneticamente programadas para desempenhar nossos papéis sociais e alimentadas com drogas que conseguiriam realizar qualquer coisa que a eugenia já não o tivesse.”


( Bertrand Hussell. No que acredito/ tradução de André de Godoy Vieira. Porto Alegre: L&PM Editores, 2007, p. 17-18 )


A critica a religião levada a cabo por Hussel em “No que Acredito” fundamenta-se em uma defesa otimista da racionalidade e do desenvolvimento cientifico, adota uma retórica oposta a do seu Icarus, que chama atenção para as possibilidades sombrias desse mesmo desenvolvimento cientifico. Logo a contraposição entre fé e ciência que aqui aparece como premissa desse ensaio, e também é evidente em outros momentos da vasta obra do autor, como por exemplo, em “A conquista da Felicidade” ou “Ensaios Ceticos”, presupõe algo mais do que um mero antagonismo ou dualismo. Na verdade o que está em jogo é um redimensionamento dos sistemas de crenças humanas a partir de uma constatação do quanto o significado da existência e do próprio mundo, para o bem e para o mal, é uma construção humana. È nesse sentido que em dado momento da obra aqui discutida ele afirma:

“....No mundo dos valores, a natureza em si é neutra- nem boa nem ruim, merecedora nem de admiração nem de censura. Somos nós quem criamos valor, e são nossos desejos que o conferem. Desse império somos reis e de nossa realeza nos tornamos indignos se à natureza nos curvamos. Estabelecer uma vida plena cabe portanto a nós, e não natureza- nem mesmo à natureza personificada como Deus.”

( Bertrand Hussell. No que acredito/ tradução de André de Godoy Vieira. Porto Alegre: L&PM Editores, 2007, p. 41 )

A crença de Russell nas potencialidades humanas e no predomínio de uma orientação racional da existência individual e coletiva revela sua grande e generosa aposta, enquanto pensador e intelectual engajado, em um potencial progresso da vida e da sociedade. Considerando, entretanto, os desafios que se apresentam ao destino humano nesse inicio de milênio, é significativo especular quanto à atualidade do pensamento de Russell no que diz respeito ao seu apego a uma positividade da razão e da racionalidade, mesmo que em sua filosofia a razão subordina-se ao desejo como essência da condição humana. Afinal, até que ponto a transfiguração da razão, o deslocamento de todos os valores e referências construídas pelo espírito moderno, não nos lança hoje a incerta aventura de deslocar o humano do centro do seu próprio mundo, a uma superação positiva de todo o humanismo?

NOW II

O desbotado instante
Desse agora
É menos que nada,
Não possui passado
Ou presente,
Nem vale a pena
A memória.

Lá fora as horas avançam,
Fatos decoram um dia chuvoso
Enquanto segue indiferente o mundo.

Mas pálido e estático
Em qualquer canto de alma
Um sonho dorme e sonha
O abstrato instante
Desse agora...

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

OF A' THE AIRTS THE WIND CAN BLAW...



Direção alguma é segura
No seguir da vida,
Nenhuma certeza é mais confiável
Que um golpe de acaso
Entre os fatos cotidianos.

Todo destino é
meu eu revelado
Entre as ruínas do desconhecido,
Não importa o caminho...

Apenas sigo por ai
Sem direção precisa...
Of a’ the airts the wind can blaw...

Sei a liberdade dos espaços
Abertos em labirintos,
Sei o espelho vazio
Diante do meu próprio rosto.

Of a’ the airts the wind can blaw...