O que mais define o símbolo em sua apropriação contemporânea como meta- significado em imagens, e meta linguagem, é a capacidade de dizer os opostos na transcendência de qualquer possibilidade de dualismo Nessa particularidade o pensar em símbolos se distancia nitidamente da lógica que define o mito cristão e seu peculiar simbolismo.
Nesse sentido julgo muito interessante reproduzir aqui um fragmento de Mircea Eliade:
“Tentamos explicar a origem dos “símbolos” através da impressão sensível, exercida diretamente sobre o córtex cerebral, pelos grandes ritmos cósmicos ( o curso do sol, por exemplo). Não nos cabe discutir essa hipótese. Mas o problema da própria “origem” parece-nos ser um problema mal colocado ( ver “Simbolismo e História”). O símbolo não pode ser o reflexo dos ritmos cósmicos enquanto fenômenos culturais, porque um símbolo sempre revela alguma coisa a mais, além do aspecto da vida cósmica que deve representar. Os simbolismos e os mitos solares, por exemplo, revelam-nos também um lado “noturno”, “mau” e “fúnebre” do sol, o que não é evidente à primeira vista no fenômeno solar como tal. Este lado de um certo modo negativo, não percebido no Sol enquanto fenômeno cósmico, é constitutivo do simbolismo solar; o que prova que, desde o começo, o símbolo aparece como uma criação da psique. Isto se torna ainda mais evidente quando lembramos que a função de um símbolo é justamente revelar a uma realidade total, inacessível aos outros meios de conhecimento: a coincidência dos opostos, por exemplo, tão abundantemente e simplesmente expressada pelos símbolos, não é visível em nenhum lugar do Cosmos e não é acessível à experiência imediata do homem, nem ao pensamento discursivo. Entretanto, evitemos acreditar que o simbolismo se refere apenas às realidades “espirituais”. Para o pensamento arcaico, uma tal separação entre o “espiritual” e o “material” não tem sentido: os dois planos são complementares. Pelo fato de supostamente encontrar-se no Centro do Mundo, uma habitação não deixa de ser um instrumento que responde às necessidades precisas e è condicionada pelo clima, pela estrutura econômica da sociedade e pela tradição arquitetural. Ainda recentemente, a velha discussão entre os “simbolistas” e “realistas” manifestou-se novamente a propósito da arquitetura religiosa do antigo Egito. As duas posições são apenas em aparência irreconciliáveis: no horizonte da mentalidade arcaica, levar em conta as “realidades imediatas” não significa de modo algum ignorar ou menosprezar suas implicações simbólicas, e vive-versa. Não se deve crer que a implicação simbólica anule o valor concreto e especifico de um objeto ou de uma operação: quando a enxergada e denominada phalos ( como acontece em certas línguas austro-asiáticas), e a semeadura é assimilada ao ato sexual ( como aconteceu em quase todos os lugares do mundo), isto não significa que o agricultor “primitivo” ignora a função específica de seu trabalho e valor concreto, imediato, de seu instrumento. O simbolismo acrescenta um novo valor ao objeto ou a uma ação, sem por isso prejudicar seus valores próprios e imediatos. Apli8cado a um objeto ou a uma ação, o simbolismo se torna “abertos”. O pensamento simbólico faz “explodir” a realidade imediata, mas sem diminui-la ou desvaloriza-la; na sua perspectiva, o universo não é fechado, nenhum objeto é isolado em sua própria existencialidade: tudo permanece junto, através de um sistema preciso de correspondências e assimilações. O homem das sociedades arcaicas tomou consciência de si mesmo em um “mundo aberto” e rico de significados. Resta saber se essas “aberturas” são meios de fuga ou se, ao contrário, constituem a única possibilidade de alcançar a verdadeira realidade do mundo.”
(Mercea Eliade. Capitulo V: Simbolismo e História in Imagens e Símbolos: Ensaios sobre o Simbolismo Mágico-Religioso./ tradução de Sônia Cristina Tamer. SP: Martins Fontes, 1996, p. 177-8)
Nesse sentido julgo muito interessante reproduzir aqui um fragmento de Mircea Eliade:
“Tentamos explicar a origem dos “símbolos” através da impressão sensível, exercida diretamente sobre o córtex cerebral, pelos grandes ritmos cósmicos ( o curso do sol, por exemplo). Não nos cabe discutir essa hipótese. Mas o problema da própria “origem” parece-nos ser um problema mal colocado ( ver “Simbolismo e História”). O símbolo não pode ser o reflexo dos ritmos cósmicos enquanto fenômenos culturais, porque um símbolo sempre revela alguma coisa a mais, além do aspecto da vida cósmica que deve representar. Os simbolismos e os mitos solares, por exemplo, revelam-nos também um lado “noturno”, “mau” e “fúnebre” do sol, o que não é evidente à primeira vista no fenômeno solar como tal. Este lado de um certo modo negativo, não percebido no Sol enquanto fenômeno cósmico, é constitutivo do simbolismo solar; o que prova que, desde o começo, o símbolo aparece como uma criação da psique. Isto se torna ainda mais evidente quando lembramos que a função de um símbolo é justamente revelar a uma realidade total, inacessível aos outros meios de conhecimento: a coincidência dos opostos, por exemplo, tão abundantemente e simplesmente expressada pelos símbolos, não é visível em nenhum lugar do Cosmos e não é acessível à experiência imediata do homem, nem ao pensamento discursivo. Entretanto, evitemos acreditar que o simbolismo se refere apenas às realidades “espirituais”. Para o pensamento arcaico, uma tal separação entre o “espiritual” e o “material” não tem sentido: os dois planos são complementares. Pelo fato de supostamente encontrar-se no Centro do Mundo, uma habitação não deixa de ser um instrumento que responde às necessidades precisas e è condicionada pelo clima, pela estrutura econômica da sociedade e pela tradição arquitetural. Ainda recentemente, a velha discussão entre os “simbolistas” e “realistas” manifestou-se novamente a propósito da arquitetura religiosa do antigo Egito. As duas posições são apenas em aparência irreconciliáveis: no horizonte da mentalidade arcaica, levar em conta as “realidades imediatas” não significa de modo algum ignorar ou menosprezar suas implicações simbólicas, e vive-versa. Não se deve crer que a implicação simbólica anule o valor concreto e especifico de um objeto ou de uma operação: quando a enxergada e denominada phalos ( como acontece em certas línguas austro-asiáticas), e a semeadura é assimilada ao ato sexual ( como aconteceu em quase todos os lugares do mundo), isto não significa que o agricultor “primitivo” ignora a função específica de seu trabalho e valor concreto, imediato, de seu instrumento. O simbolismo acrescenta um novo valor ao objeto ou a uma ação, sem por isso prejudicar seus valores próprios e imediatos. Apli8cado a um objeto ou a uma ação, o simbolismo se torna “abertos”. O pensamento simbólico faz “explodir” a realidade imediata, mas sem diminui-la ou desvaloriza-la; na sua perspectiva, o universo não é fechado, nenhum objeto é isolado em sua própria existencialidade: tudo permanece junto, através de um sistema preciso de correspondências e assimilações. O homem das sociedades arcaicas tomou consciência de si mesmo em um “mundo aberto” e rico de significados. Resta saber se essas “aberturas” são meios de fuga ou se, ao contrário, constituem a única possibilidade de alcançar a verdadeira realidade do mundo.”
(Mercea Eliade. Capitulo V: Simbolismo e História in Imagens e Símbolos: Ensaios sobre o Simbolismo Mágico-Religioso./ tradução de Sônia Cristina Tamer. SP: Martins Fontes, 1996, p. 177-8)
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