segunda-feira, 18 de outubro de 2010

SOBRE UM MUNDO SEM SUBSTÂNCIA E ESSÊNCIA by Richard Rorty



Em seu ensaio “UM MUNDO SEM SUBSTÂNCIA OU ESSÊNCIA”, o célebre filósofo norte americano Richard Rorty, afirma a convergência entre a filosofia analítica norte-americana e a filosofia do continente europeu a partir de uma tendência comum a antimetafísica e antiessencialista do pensamento contemporâneo, na tentativa de desvencilhar-se do dualismo herdado da tradição grega. Desta forma, filósofos tão diferentes como Frederich Nietzsche, Donald Davidson, Jaques Derrida, John Dewey e Michel Foucaut, convergem, cada um a sua maneira, para uma critica radical da tradição filosófica ocidental.
Nas palavras do autor,

“Como uma primeira ilustração da convergência entre a filosofia analítica e a continental, quero mostrar que esses dois slogans acabam sendo mais ou menos a mesma coisa. Ambos são maneiras de dizer que nunca seremos capazes de pisar do lado de fora da linguagem, nunca seremos capazes de apreender uma realidade uma realidade que não seja mediada por uma descrição lingüística. Assim, ambos são maneiras de dizer que devemos suspeitar da distinção grega entre aparência e realidade, e que devemos tentar substituí-la por algo como a distinção entre  “ descrições menos úteis do mundo” e “descrições mais úteis de mundo”. Dizer que tudo é uma construção social é dizer que nossas práticas lingüísticas estão tão entrelaçadas com nossas outras práticas sociais que nossas descrições de natureza, assim como nossas descrições de nós mesmos, serão sempre uma função de nossas necessidades sociais. Dizer que toda consciência é um fato lingüístico é dizer que não temos nenhum conhecimento do tipo que Bertrand Russell, trabalhando na tradição do empirismo britânico, chamou de “conhecimento por familiaridade”. Todo conhecimento que temos é do tipo que Russell chamou de “conhecimento por descrição”. Se associarmos os dois slogans, teremos a afirmação de que o nosso conhecimento todo é formado por descrições adequadas de nossos propósitos sociais correntes.
Esta afirmação é antimetafísica no sentido mais amplo do termo metafísico- o sentido empregado por Heidegger, quando ele dizia que todo platonismo é metafísico e toda metafísica é platonismo. Platonismo, nesse sentido amplo, é uma tentativa de libertar-se da sociedade,  do nómos, da convenção e dirigir-se para physis, a natureza. Mas se os dois slogans que acabei de citar, estão corretos, então não existe algo como a physis a ser conhecido. A distinção nómos-physis-convenção-natureza-desaparece pelas mesmas razões que a distinção apar~encia-realidade também desaparece. Uma vez que se tenha dito que todo conhecimento é uma descrição, e que as descrições são funções de necessidades sociais, então “natureza” ou “realidade” só podem ser nomes para algo incognoscível- algo como a “coisa em si” de Kant. Todo movimento do pensamento filosófico ocidental, desde a época de Hegel, tem sido uma tentativa de evitar esse incognoscível.
Kant representou um momento de virada na história da filosofia ocidental, porque seu trabalho foi um reductio ad absurdum da tentativa de distinguir o papel do sujeito e o papel do objeto na constituição do conhecimento. Hegel compreendeu isso, e compreendeu que as distinções entre objetivo e subjetivo tinham de ser transcendidas. Infelizmente, o próprio Hegel utilizou os termos subjetivo e objetivo para descrever a sequência de descrições que as sucessivas necessidades sociais tornaram imperativas, à medida que o progresso intelectual e moral continuava, e utilizou a expressão “união entre sujeito e objeto” para descrever o fim da história. Isto foi um erro de Hegel, porque ele levou a sério demais um dualismo ultrapassado. Teria sido melhor se ele tivesse feito o que mais tarde Dewey fez: descrito o progresso intelectual e moral como crescimento, ao invés de emancipação, e tratado esse progresso como conduzindo à democracia, e não à auto realização do espírito absoluto. Dewey foi o filósofo que mais clara e explicitamente deixou de lado o propósito comum aos gregos e aos idealistas alemães- a representação acurada da natureza intrínseca da realidade- em benefício do propósito político da democracia participativa. É por isso que , como eu disse na primeira conferência, ele me parece a figura mais significativa e mais útil da filosofia do século XX.”

(Richard Rorth. Um Mundo sem Substâncias ou Essências in Pragmatismo: A Filosofia da Criação e da Mudança; Cristina Magro e Antônio Marcos Pereira, organizadores-BH:Ed. UFMG, 2000; p. 57 à 59)                         

NOTA SOBRE NIILISMO CONTEMPORÂNEO E PÓS-MODERNIDADE


A construção de novas multiplicidades, de novas codificações de mundo, que possuem como centro à experiência da individualidade humana, é a premissa do devir que inspira a experiência da contemporaneidade, de nosso niilismo de tempo presente, que não é, cabe esclarecer, propriamente uma frustração da possibilidade de crença ou refutação de qualquer conceituação forte de “verdade”.
Trata-se, de modo mais preciso, de uma reinvenção da própria noção de real, agora concebido como codificação lingüística e arbitrário acontecer de ilegíveis imanências, que substitui a antiga segurança proporcionada por  idealizações universais e totalizantes da já carcomida e disfuncional cultura da modernidade.
Seu desdobramento no plano ontológico é o narcisismo, a evasão personificada pela multiplicação ao infinito de combinações de imagens e enunciados que potencializam as possibilidades de subjetivação do indivíduo enquanto esboço estruturalmente inacabado de suas próprias auto representações.
Cada vez mais retraídos em sua vida privada, restritos ao micro universo de codificações de um real opaco, fluido e instável, surpreendemos a experiência do “eu”, enquanto consciência objetiva e projetada em cada individualidade de um peculiar “estar-no-mundo”, tornar-se “aberta”, deslocada de suas próprias premissas de sociabilidades e intersubjetividades.   

domingo, 17 de outubro de 2010

NOTA SOBRE PRAGMATISMO E PÓS MODERNIDADE



Não tenho qualquer duvida de que, até o momento, o pragmatismo foi a grande contribuição do continente americano à tradição filosófica ocidental, um desafio a todo conservadorismo reflexivo de inspiração direta ou indireta greco-latina, no risonho e complexo esforço de inaugurar novas codificações do vivido como linguagem contra toda metafísica do pensamento... Contemporaneamente, entretanto, já não se trata de estabelecer novas bases para construção da realidade, mais desfazê-la no aleatório das imanências que nos fundam como indivíduos...

BOM SCOTT E A CULTURA SOCIAL DO ROCK



Definitivamente, nenhum outro mito da história do rock seja mais singular do que aquele construído pela morte prematura de Bom Scott, do AC/DC. Digo isso por que ele simplesmente encarnou com singela e profunda singularidade a imagem mais elementar da cultura social inspirada neste estilo musical, o Puer aeternus, a eterna criança, cujas implicações na cultura contemporânea não são absolutamente irrelevantes...
Em seu livro LET THERE BE ROCK: A HISTÓRIA DA BANDA AC/DC, Susan Masino conseguiu com precisão destacar este singular aspecto que define a própria identidade da banda:

“Não há palavras suficientes para descrever o impacto que Bom Scott sempre teve sobre o AC/DC. Seu espirtito fortaleceu o rock visceral dos irmãos Young e suas letras moldaram essa imagem até hoje. Bom era um sujeito original, cuja atitude extrema com relação à vida deu a música ousada, sem barreiras dele, uma voz rebelde que ainda estimula centenas de milhares de pessoas a erguerem os punhos no ar.
Angus costumava dizer:” Bom nunca ponderou muito sobre o sentido da vida. Viveu o momento.” Ele  também apreciava muitos desses momentos, como disse Angus à Sounds em julho de 1986: “Bom se juntou a nós muito tarde na vida, mas aquele cara tinha mais juventude nele do que pessoas com a metade de sua idade. Era assim que ele pensava  e eu aprendi a com ele. Viva a vida e seja sempre um grande garoto”.
Robin Zander do Cheap Trick brincou: “Eu gostava de tomar café da manhã com Bom porque ele sempre pedia um croissant ou alguma outra coisa com um copo de uísque”. Kirk Dyler, diretor da Turnê do Cheap Trick, concordou: “Ah,é, é porque ele [Bon] nunca se importou com nada! Sua atitude era: ’Eu não estou nem ai se você me conhece ou não, agora onde é a festa?’ É assim que eu mais me lembro dele.”

( Let there be rock: a história do AC/DC, Susan Masino; tradução Alexandre Barbosa de Sousa. SP: Companhia Editora Nacional, 2009, p. 189)             

RELES FANTASIA

Minhas mãos escritas
No ar e no tempo,
Múltiplas e coloridas
Na diversidade de cada
Momento,
Somam vazios
No transparente espaço
Do esquecimento,
Minhas mãos perdidas
tremulas e infantis
esquecidas em algum
impossível futuro.

nota sobre individualidade e contemporaneidade


Já não há verdades universais a inventar certezas de mundo e significados. Já não compartilhamos o mesmo universo e princípios de realidade no cotidiano intercâmbio humano.
Somos todos apenas indivíduos dispersos e isolados a viver de imanências, mergulhados no superficial de  fatos e atos cotidianos que já não edificam qualquer ilusão satisfatória de coletividade .   
Se quer esperamos o consolo de qualquer outro destino além da certeza da morte como a mais elementar condição de nossas ralas existências.  
Tudo que ainda podemos fazer é buscar autenticidade, encontrar aquilo que nos faz singulares e nos permita a certeza de que somos distintos de todos os outros indivíduos existentes na face da terra...
Em poucas palavras, a realização da individualidade é a única perspectiva que ainda condiciona o acontecer humano no tempo presente.   

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

AFORISMAS SOBRE A TRANSPARÊNCIA DO VIVIDO



Ser sincero deve ser uma forma de não se levar a sério
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Não raramente a mentira é apenas uma realidade na qual não conseguimos acreditar.
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Nada é mais profundo do que o complexo da superficialidade como linguagem básica das vividas e cotidianas imanências.
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Viver a idéia de sociedade é um modo de recusar a simplicidade  da pura dialética do eu e do outro interna e externamente.
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Quanto mais nos enterramos em nós mesmos, menos nos conhecemos, pois o eu é uma experiência projetada.
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Não existe erro maior do que a confissão de que acreditamos sinceramente em alguma coisa.
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A felicidade é um sonho que não aprendemos ainda a sonhar como objetividade de um não sentido...   
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Viver é correr contra o tempo sem esperanças de salvação...

quarta-feira, 13 de outubro de 2010

BREVE NOTA ALEATÓRIA SOBRE O SIGNIFICADO DO DIA DOS MEUS ANOS


No ilegível e falso momento do dia dos meus anos, pretendo apenas escrever futuros, rasgando meu rosto em profunda busca de autenticidade, erguer contra os fatos de agora a faca do vento e do tempo, reinventando a soma de todos os momentos arcaicos de mim mesmo...