sábado, 30 de abril de 2011

REVOLUÇÃO CIENTIFICA x RELIGIÃO


A profunda transformação introduzida por Copérnico e Galileu na imagem de mundo convencionalmente aceita em sua época, tendo por ponto de partida o heliocentrismo, a conseqüente desconstrução do cosmo hierárquico aristotélico e sua gradual substituição pela idéia de um “universo infinito”, parece hoje fugir a experiência do homem contemporâneo. Ironicamente, tal revolução também passou despercebida a maioria dos seus contemporâneos. O conceito de “revolução cientifica” foi construído a posteriori e pode ser considerada um “mito historiográfico” já que se quer parece crível na cabeça de seus fundadores .
Um exemplo disso é o fato de Nicolau Copernico se quer fazer idéia das implicações futuras de  sua obra e permanecer preso a uma imagem sagrada de mundo. Como se pode ler em sua clássica obra ele abalava as codificações tradicionais de realidade de seu tempo sem efetivamente questioná-las.  Na mesma medida em que defendia o heliocentrismo sustentava,  por exemplo, a imagem de um universo esférico, inspirando-se em falácias de fé ou, mais precisamente na imagem do circulo como símbolo da totalidade:

“Compete-nos notar desde o inicio que o universo é esférico ou porque seja esta a forma mais perfeita de todas, um todo inteiro sem qualquer junção de partes; ou porque ela própria seja a mais capaz das figuras e maximamente conveniente para encerrar e conservar todas as coisas; ou até porque as partes mais perfeitas do Universo, isto é, o Sol, a Lua e as estrelas, se apresentarem com esta forma e porque todo o Universo tende a ser por ela delimitado. E isto mesmo se vê nas gotas de água e nos outros corpos líquidos quando revestem a sua forma natural. Pelo que ninguém deverá hesitar em atribuir tal forma aos corpos celestes.”

( Nicolau Copérnico. As revoluções dos orbes celestes/ tradução de A. Dias Gomes. Portugal: Fundação Calouste Gulbenkian, s/d., p. 17)

A autonomia do saber científico, sua confrontação e independência do campo teleologico, é uma conquista que se deu apenas nos oitocentos com a reestruturação ou codificação do paradigma cientifico patrocinado pela ilustração. A ciência, em outras palavras, apenas muito recentemente, adquiriu sua maioridade e libertou-se da tutela do obscuro campo do sagrado. A verdadeira “revolução cientifica” esta apenas começando...  

quinta-feira, 28 de abril de 2011

SENTIMENTO DE MUNDO

Não sei direito



Se os sentimentos


Do tempo vivido


Realmente existem...


Mas sei que os sinto,


Dentro e fora de mim


Na soma aleatória


De todas as coisas.






Sei os silêncios e ausências


Que me levam adiante,


Que me perseguem


No incerto de idéias


E pensamentos


Através dos quais


Inventa-se o mundo...

quarta-feira, 27 de abril de 2011

ANDREAS VESALIUS: DE CORPORIS HUMANI FABRICA

De Corporis Humani Fabrica de Andreas Vesalius é um texto chave do Renascimento. Trata-se da primeira analise do corpo humano e sua dinâmica a partir da observação direta através da dissecação de cadáveres. Mesmo nos tempos de hoje as ilustrações que compõe a obra fascinam por sua precisão.

O texto de Vesalius é uma critica a medicina de Galeno e um dos mais importantes marcos da nova imagem de ciência gestada nos primórdios da modernidade. Pode-se dizer que nossas  atuais codificações e representações do humano começaram com ele ...






terça-feira, 26 de abril de 2011

NOTA PARA REDEFINIÇÃO DO INDIVIDUO



Existir é uma busca pela transcendência da particularidade através da individualidade e da recusa dos universais... Pois nosso micro e intimo universo de sociabilidades e vitalidade é tudo que realmente importa na invenção ou reinvenção do privado enquanto espaço mais significativo da condição humana contraposto as estratégias coletivas.
A cultura contemporânea, afinal, nos libertou do imperativo dos fatos coletivos e personas como metas biográficas na decadência cada vez mais evidente da falácia do “homem público” da sociedade massificada....   

INFÃNCIA A CONTRAPELO


Do outro lado do jardim da infância



Busquei meu futuro


No auto engano


De qualquer migalha de emoção


E cores


Como se soubesse


Mil mundos ocultos


No mistério do teu rosto,


Como se sonhasse em tudo


O segredo físico e concreto


Do teu corpo...

JEAN STAROBINSKI, MONTESQUIEU E AS CARTAS PERSAS



No rastro da revolução cientifica dos sec. XVI e XVII a cultura européia vivenciou uma reinvenção da relação entre o homem e o mundo que permanece em curso até os dias de hoje. Afinal,  se superamos a ideia de uma natureza portadora de significados, tão em voga até o séc. XVIII, ainda nos conformamos  a qualquer senso comum.

A  maioria de nós vive distante das transformações que definem nossa própria época no que ela tem de mais contemporâneo...  Somos todos vítimas de alguma  ficção elementar de realidade configurada pelas inercias do passado que nos é legado pelo nossos ancestrais imediatos.
Gostaria de ilustrar o fato com uma provocante citação de Jean Starobinski em seu clássico ensaio sobre Montesquieu:

 “A boa nova que as Cartas persas traziam para os leitores europeus de 1721 era a da factilidade universal. Os homens são o que seus hábitos, seu clima e sua educação fazem deles. Quando os persas foram a paris perguntando o porquê de cada costume e cada rito, o importante não era a resposta a esse porquê, mas o simples fato de que se possa perguntar porquê. E essa simples questão revela instantâneamente o absurdo das crenças e dos ritos, que só subsistem porque nunca lhes havíamos  questionado os motivos.  Há nisso um “como se pode ser Frances?”, que responde implicitamente ao “como se pode ser persa?”. E eis  o que pode parecer estranho: a prova das máscaras é uma prova da verdade. È preciso introduzir personagens disfarçadas e mascaradas para que a verdadeira natureza dos homens se desmascare na presença delas. Assim, em Cosi fan tutte, a chegada dos noivos disfarçados de senhores orientais, que torna gritante e ridículo dos juramentos e das promessas, revelará a verdade oculta da inconstância; é montando uma comédia que descobrem que a fé jurada seriamente não era senão comedia. Montesquieu faz o mesmo; sua ficção dos persas demonstra que se vive de ficções . O oriente real não tem nada a ver com isso. É um espetáculo que os homens do Ocidente se proporcionaram para libertarem-se dos valores do Ocidente.”

Jean Starobinski. Montesquieu. Tradução de Tomás Rosa Bueno. SP: Companhia das Letras, 1990, p. 59-60

segunda-feira, 25 de abril de 2011

NO NÃO LUGAR DO PENSAMENTO


Tantas coisas cabem



No não lugar do pensamento...






Todas minhas tolas ilusões


De humanidade, felicidades


E futuros


Estão guardadas nele


Ao lado do mero sentir


O agora.






Tantas coisas...


Tudo que sou


E um pouco dos outros...

domingo, 24 de abril de 2011

NOTA SOBRE A GRAMATICA DA VIDA



O modo como falamos, nosso arcabouço lingüístico e imagético, não revela propriamente nossa posição social ou grau de instrução e introjeção mecânica do cânone cultural vigente, mas nosso  modo próprio ou capacidade de codificar o mundo e a realidade.  Assim sendo, o domínio pleno das formulas gramaticais não é indício de coisa alguma enquanto não somos capazes de subverte-lo como indivíduos em estranhos exercícios de mera sociabilidade líquida...   

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O DESAFIO DO ACASO



Tudo que vejo agora
 é o limite das concretas
e materiais formas
de matéria, tempo e espaço
explodindo o limite
do simples pensamento...

Tudo que vejo agora
É o paradoxo
De me saber vivo
Desafiando as certezas
De mero 
E ILEGIVEL
cotidiano...

ORALIDADE, ESCRITA E CONTEMPORANEIDADE



Através das novas mídias digitais e a reinvenção da imagem através do virtual, ocorre na contemporaneidade uma espécie de reinvenção da oralidade gente ao até então consagrado domínio da escrita.  Falar vem se tornando um ato cada vez mais complexo que se reflete no modo como lidamos ou subvertemos a escrita ao sabor do fluxo instantâneo da linguagem oral e seus desafios a gramática, tão subserviente as necessidades da palavra escrita e suas regras... Pode-se dizer que a ciencia histórica tal como conhecemos, fundada na gramática e na escrita como forma  é uma sucessora direta das narrativas orais da velha cultura pagã na codificação do passado coletivo como memória social...
Apropriando-me aqui de um fragmento de  Hans Magnus Enzensberger: 

“De uma perspectiva histórica, a literatura escrita só teve papel dominante por poucos séculos. A predominância do livro hoje nos parece apenas um episódio. Um período incomparavelmente maior a precedeu  quando a literatura era oral; agora, ela é absorvida pela era das mídias eletrônicas, que, com sua tendência intrínseca faz, por sua vez, todos falarem. Em seu auge, o livro de certa forma usurpou as formas de produção do passado, primitivas mas à disposição de todos. Por outro lado, ele representou as formas de produção futuras, que permitem  a cada um de nós se tornar produtor.”

Hans Magnus Enzemberger. Elementos para uma teoria dos meios de comunicação/tradução de Claudia S.Dornbusch. SP: Conrard Editora do Brasil, 2003, p. 91