domingo, 28 de fevereiro de 2010

UM FRAGMENTO DE J LOCKE


"Os homens tomam as palavras como sendo as marcas regulares e constantes de noções aceites, quando na verdade não são mais que sinais voluntários e instáveis das suas próprias idéias. [...] Esse abuso, que leva a confiar cegamente nas palavras, não foi em nenhum lugar tão disseminado, nem ocasionou tantos efeitos maléficos, como entre os homens de letras. A multiplicação e obstinação das disputas que têm devastado o mundo intelectual deve-se tão-só a esse mau uso das palavras. Pois, ainda que em geral se acredite existir grande diversidade de opiniões nos volumes e variedade das controvérsias que agitam o mundo, o máximo que posso constatar é que, ao discutirem entre si, os doutos em contenda nas diferentes facções falam línguas distintas. "

John Locke, in 'Ensaio Sobre o Entendimento Humano'

NOTA SOBRE O CONCEITO DE VERDADE


O modo como diariamente buscamos estabelecer ou representar a realidade fora de nós, definir as condições objetivas do mundo, não é muito claro ou sistemático. Assenta-se costumeiramente sobre inúmeros preconceitos e ilusões quanto “a natureza” das coisas. Poder-se-ia dizer que somos socialmente condicionados a acrítica experiência de dada formatação ou idéia de realidade sem a devida consideração de sua relação com nossas crenças subjetivas e limitações cognitivas.

Em síntese, pode-se dizer que uma determinada sentença não é verdadeira por sua objetividade, por sua correspondência ao real, mas por ser aceitável ou convincente em termos de linguagem.

A verdade, portanto, é uma questão de persuasão e consenso inerente ao intercambio humano e não uma revelação do mundo como objetividade autônoma.

REAL MICRO


Posso vislumbrar

O oculto universo que existe
Em um grão de pólen
A flutuar ao sabor do vento.

Sei que
Quanto menor a realidade
Mais complexa
É sua verdade...

Time and emotions
Peacefully imprisioned
On images to form...

sábado, 27 de fevereiro de 2010

FALSA NOTA BIOGRÁFICA

Tenho vivido de vazios mais do que de verdades e certezas.
Desencantado e sujo o mundo se apresenta diante de mim em seu profundo silêncio de fatos cotidianos sustentando tudo aquilo que sou no caótico da condição humana...
Aprendi a nada esperar de futuros e a me surpreender com a mera constatação de estar presente em mais um dia seguinte...

LAZER

Afogado em uma tarde de sol

Perco-me nos labirintos de significações
Que falsamente definem a vida.
Toco o acaso e o vazio
Na embriaguez de todas as coisas...

Surpreendo-me livre,
Sem questões ou respostas.
Futuro algum me aguarda
Na próxima esquina...
Apenas assovio
E vivo a vida.

domingo, 21 de fevereiro de 2010

EVERYBODY LIES: HOUSE'S PHILOSOPHY


Mentiras suavizam as coisas e facilitam a vida... Para a maioria das pessoas é insuportável ser simplesmente si mesmo diante dos outros, assumir publicamente seus limites, erros, imperfeições ou meras opções e vontades mais autenticas...

Mentiras suavizam nosso próprio peso sobre as costas; o quanto por mera covardia suportamos muitas coisas em nome do grande vazio da diaria sobrevivência entre os outros... No fundo, toda vida socialmente compartilhada não passa de um grande teatro...

O DESAFIO DE SER VOCÊ MESMO...


No mundo contemporâneo, onde a atomização dos indivíduos é a mais cara premissa das sociabilidades e invenções de coletividades, os interesses particulares e as paixões mais básicas ocupam o primeiro plano do jogo dos tantos tipos de relacionamentos possíveis entre os seres humanos .

Hoje, como nunca antes, as pessoas são acima de tudo motivadas pelas questões de suas vidas privadas em lugar de abstrações morais ou modelos coletivos de comportamento. Predominam os dilemas e afirmações egoicos sobre o compromisso com o artificalismo das personas e papeis coletivos.

Nada há de errado nisso. Pessoalmente, considero este fenômeno um grande avanço da cultura contemporânea. Só não posso deixar de notar o quanto a maioria das pessoas, cotidianamente, demonstra simplesmente não saber lidar com sua própria individualidade...

NOTA SOBRE O SILENCIO


Segundo nossos dicionários, o silencio é o estado de quem se abstém de falar e a ausência de sons e ruídos. A palavra também é associada a taciturnidade e sossego. Em todos esses casos ela remete a idéia de passividade e inércia. Mas quem já contemplou o silêncio de uma bela paisagem ou a riqueza da tela de um quadro sabe o quanto o silencio é um fenômeno muito mais rico e complexo. Na verdade ele delimita um vasto campo de atividades não verbais, o domínio do imagético e do sensual.
Em poucas palavras, o silencio é essencialmente o modo físico e concreto através do qual experimentamos a realidade sem traduzi-la em linguagem verbal....

ILUSION

A vida

É em grande parte
Sonhada
Nos desejos que inspiram
O mais profundo do pensamento.

Buscamos o tempo todo
Realizar o ideal de nossas vontades,
Enganar a realidade.
Mesmo sabendo
Que nunca teremos
Tudo aquilo que queremos
Em nossas ilusões de felicidade...



sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A RISING SUN


Amanhece...



É tudo de novo


Outra vez


Em meu magro e precário viver.


Sigo mudo o enredo da existência


Sem nada esperar


Das horas


Desenhadas adiante


Pelo acaso.






Sei que o sol


Apenas refaz as ilusões de mundo


Em banal novidade...







RICHARD WILLIEN E A TRADUÇÃO OCIDENTAL DO I CHING


Richard Williem, o sinólogo e melhor tradudor para o inglês do I Ching, entendeu o TAO como “sentido” ou “significado”, como o princípio ou premissa de inter-relacionamento de todas as coisas. Trata-se, em termos ocidentais, de uma recusa da dicotomia entre mente e matéria inspirada em Descartes.

O TAO era para ele, assim como para seu amigo C G Jung, um principio acausal que integra o exterior do mundo e o interior da auto consciência individual em uma unidade psicológica que estaria na base de nossa experiência de realidade...

segunda-feira, 15 de fevereiro de 2010

A CIENCIA MEDICA DE HOUSE by andrew holtz


“PERIGO NO MEDICO- É preciso ter nascido para seu medico, caso contrario se perece pelo seu medico.” F. Nietzsche in Humano, Demasiadamente Humano.

CIENCIA MEDICA DE HOUSE by Andrew Holtz, é uma obra impar que apresenta um interessante panorama da prática medica norte americana tomando como inspiração o universo ficcional da premiada serie de Tv exibida pela FOX.
Ao final da leitura o leitor leigo obtém um satisfatório quadro geral sobre alguns aspectos técnicos da série, podendo ponderar sobre suas verdades e exageros e, acima de tudo, refletir sobre o mito do Dr. House e o tipo de racionalidade e individuo que ele representa e personifica no imaginário social.
Se o livro de Holtz nos chama demasiada atenção para a impossibilidade de existencia de um House entre os nossos médicos reais, dado seu irreverente talento para solapar a ética medica das mais imaginativas formas possíveis, por outro lado, é inegável que a personagem personifica algo de essencial a pratica da medicina: a combinação entre conhecimento, intuição, experiência e bom julgamento, que não raramente falta aos nossos médicos reais conformados aos protocolos éticos e convenções do cotidiano hospitalar.
Segundo o autor, House corresponde a chamada doutrina da medicina baseada em evidencias:

“De certo modo, a personalidade do dr. House está bem enquadrada na doutrina da medicina baseada em evidencias. Embora a maior parte das pessoas tenda a confiar nas opiniões de especialistas, ele demonstra pouco respeito pelas figuras de autoridade ou pelos conselhos de especialistas, com base apenas em suas reputações. Ele não escolheria determinado tratamento simplesmente porque algum especialista o considerou a melhor opção para o caso.
É exatamente assim que funciona a medicina baseada em evidencias. A ‘opinião especializada” é considerada a menor forma de evidencia possível; não é desprovida de valor, mas é algo que só deve ser usado quando não houver outros dados disponíveis. Afinal de contas, a opinião dos especialistas pode não ser mais do que a soma do que um único medico lembra de sua experiência clinica, que esta sujeita aos caprichos da memória e aos naturais vieses humanos.”

( Andrew Holtz. A ciência medica de House: A verdade por trás dos diagnósticos da série de TV. Tradução de Adriuana Rieche. RJ: Editora Best Seller, 10° ed. , p. 161-162. )


NIETZSCHE E O SEGREDO DO ESCRITOR



Um bom escritor deve transgredir a linguagem com sua caligrafia a ponto de transformá-la em metáfora do indizível e ilegível cotidiano vivido que transcende o mero cotidiano e socialmente estabelecido.
Um bom escritor nos oferece uma chave para o desconhecido...
Segundo o aforismo 183 de Nietzsche em Humano, Demasiadamente Humano:

“ A CHAVE. O pensamento isolado ao qual um homem notável atribui um grande valor, para riso e zombaria dos insignificantes, é para ele uma chave de tesouros ocultos; para aqueles , nada mais que uma peça de ferro-velho.” .

EXISTENCIA E ONTOLOGIA

A existência é uma esfinge que nos desafia a responder enigmas e escapar a labirintos que só existem como partes estranhas de nós mesmos...

Somos nossas próprias questões e os vazios que nos motivam como vontade e desejo em uma busca inútil do próprio rosto. Por isso acontecemos em círculos...


DIA PERDIDO


Um dia de azul aço
Cobre todas as coisas,
Cai sobre os olhos
E as almas
Que habitam cada individuo.
Hoje não haverá destinos
Ou rotinas.
Apenas o tempo
Preso ao corpo
E o silêncio do mundo
Até o derradeiro instante
Do riso noturno
Escrito em sonho...

A INDIVIDUALIDADE COMO SEGREDO

A essência da individualidade é a afirmação da singularidade, o que é o mesmo que dizer que ela é definida pela capacidade de cada um para interagir com os outros de modo contraposto apesar da intermediação de um referencial simbólico compartilhado. Desta forma, se a auto-consciência é um fenômeno ambíguo condicionado a mentalidade coletiva, o mesmo não se pode dizer com relação ao sentimento irracional de propósito ou meta particular que define a experiência de uma dada biografia vivida. Refiro-me aquele conjunto de fantasias pessoais que aproximam o esforço de perpetuação e construção de uma existência singular da construção de uma obra artística cujo conteúdo e significado não somos capazes de compartilhar com os outros, mesmo quando lhe comunicamos.

Tornar-se um individuo é adquirir-se como “um segredo” ou meta-significado, como um complexo processo irracional e ontológico que escapa a qualquer expressão lingüística.

É justamente como indivíduos que somos capazes de transcender a natureza através de uma consciência diferenciada.

sábado, 13 de fevereiro de 2010

SEA...

O mar de agora

Não guarda os mesmos encantos
Que o mar antigo,
Já não nos conduz
Ao desconhecido.
Mas ainda é em essência
Infinita imensidão
A desafiar a humana finitude.

O mar
Ainda impõe fantasmalidades
E fantasias
Embalando pensamentos
De aventura e solidão
No gritar de algum
Mundano desafio.

The sea is the life
And time...

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

NOTA SOBRE O PARADOXO DA INDIVIDUALIDADE HUMANA

É na medida em que nos fazemos cada vez mais conscientes de nós mesmos que inventamos e reinventamos o mundo, nosso sentimento próprio de singularidade, que nos permite compartilhar subjetivamente o existir humano.

Nos individualizamos através dos outros em paradoxo esforço de íntimo acontecer...

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

DESAFIO

A existência segue no vazio de rotinas, enquanto administro o tempo que passa refazendo a mim mesmo nos atos de dia a dia. Sei que brinco constantemente com o acaso, tentando me tornar futuro no superficial dos mais íntimos fatos.

O que sei é que talvez passe a vida inteira tentando inutilmente escrever dentro do tempo um especial momento de ser entre as coisas...



sábado, 6 de fevereiro de 2010

NOWHERE MAN FOREVER...?


A VIDA ACONTECE


LÁ FORA E NESTE MOMENTO,

INDEPENDENTE DO QUE FAÇO

E PENSO

AQUI DENTRO...



NÃO EXISTO PARA O MUNDO

E ELE POUCO SIGNIFICA

PARA MIM.



A ÚNICA REALIDADE

QUE CONHEÇO

E RECONHEÇO

É A DO MEU PRÓPRIO EU...

I'M NOWHERE MAN...

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

CANT’T BUY ME LOVE by JONATHAN GOULD III


Em CANT’T BUY ME LOVE, Jonathan Gould identifica algumas particularidades importantes que contribuíram para tornar os Beatles a mais emblemática e impactante banda de rock de todos os tempos.
Segundo o autor, por exemplo, os Beatles foram os primeiros artistas não americanos com exposição na mídia de massa a conquistar a condição de SUPERSTAR em caráter mundial. Ao mesmo tempo, eles também negavam todos os estereótipos do que significava ser inglês em 1964, ou seja, após o desmonte do Império Colonial Britânico.
Em suas palavras,

“... ao afirmar sua origem na cidade portuária de Liverpool, no Lancashire, cuja população poliglota de minorias étnicas e religiosas faziam dela a cidade menos homogeneamente “inglesa” da Inglaterra. Os Beatles personificavam uma versão iconoclasta de sua identidade nacional que se provou tão atrativa para as juventudes norte-americana, européia, australiana e de partes da Ásia quanto os fãs britânicos.”
( Jonathan Gould. Cant’t Buy Me Love: OS Beatles, A Grã Bretanha e os Estados Unidos./ Tradução Candoba. SP: Larouse, 2009, p. 18)

Também sua identidade enquanto banda de rock os distinguia dos seus pares, pois:

“Os Beatles eram uma visão de auto-suficiência, independência e ambição compartilhada que proporcionou a musica popular o arquétipo de “banda de rock”, um modelo de organização musical que viria a perdurar nas décadas seguintes.”
(Idem)

Em essência a ascensão dos Beatles foi, entre outras coisas, um sintoma de profundas mudanças nas relações anglo-americanas ocorridas após a Segunda Grande Guerra, quando a Inglaterra, a maior nação imperialista do séc.XIX, cedeu lugar no cenário mundial aos USA, a maior nação internacionalista do séc.XX. Fato político que determinou profundamente a evolução ( ou revolução) cultural da segunda metade do século XX.

PERSONA


Parte de mim é triste

Por não reconhecer
Diante do espelho
O rosto que me sustenta
Entre os outros.
Pois sabe que,
Ao mesmo tempo,
Ele me apaga de mim mesmo
No silencio da aparência,
Obscurecendo a abstrata face
Que me torna humana ilusão
No acontecer do tempo...



OPUS



Enterro futuros
Nas almas das coisas
Através dos atos
Que me definem
Provisoriamente
Como migalha
De sangue e carne...


Meu destino, entretanto,
Pouco me importa....

Aceito no mesclar dos dias

O novíssimo acontecer de mim mesmo,
O efêmero e agora da vida,
Como principio único da existência.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

MORTE AO VIVO ( THE LIVING END) BY STANLEYN ELKIM


Originalmente publicado em 1979 MORTE AO VIVO ( THE LIVING END) by Stanleyn Elkim, permanece sendo uma perola única da ficção contemporânea norte americana. Arrisco-me a defini-la como uma espécie de comedia teológica, gênero que deveria ser mais explorado, onde os valores morais e crenças de inspiração judaico cristã, inspiradas pelo maniqueísmo entre o bem e o mal são relativizadas em uma metafísica comedia de costumes...

Ellerbee, a personagem central da narrativa, é o correto e digno dono de uma loja de bebidas que acaba assassinado durante um assalto. Em sua vida alem tumulo ele se confronta com o caprichoso e megalomaniaco deus do antigo testamento, que não exita em lhe mandar para o inferno simplesmente porque costumava abrir seu comercio aos domingos.

Com um humor corrosivo Elkim cria um cenário e uma leitura insólita e absurda da vida após a morte revelando o lado sombrio do criador e da eternidade; lado tão sombrio que dispensa a existência de um opositor personificador do principio do mal.

A narrativa termina com um surpreendente juízo final, aqui entendido como a ressureição dos mortos e o golpe final de deus diante de uma perplexa e mal resolvida “sagrada família”.

Trata-se, definitivamente, de uma experiência única mergulhar nas paginas desta deliciosa paródia da “Divina Comedia”....

BLACK TIME


Agora a pouco



O tempo


Passou por mim


Sonhando...


Passou triste


E pensativo,


Sem ilusões de eternidades.


Sei que buscava em silencio


O mais intenso


Dos futuros possíveis,


As mais profundas horas


De um amanhã desnudo


E ininteligível que jamais viverei...