domingo, 30 de novembro de 2008

RELIGIÃO PESSOAL: A EXPERIÊNCIA ARCAICA DO SAGRADO E O INDIVIDUO CONTEMPORÂNEO


A experiência subjetiva do sagrado é de fato uma das formas como a psique objetiva se revela na experiência singular de um indivíduo. Como já havia percebido WILLIAM JAMES, o sentimento religioso é uma entidade mental multifacetada que se revela de modo autêntico e profundo enquanto assimilação pessoal e singular de pensamentos e sentimentos.
Em suas próprias palavras

“Num sentido, pelo menos, a religião pessoal se revelará mais fundamental do que a teologia ou o eclesiasticismo. Depois de estabelecidas, as igrejas passam a viver de uma tradição de segunda mão; mas os fundadores de cada igreja deveram o poder, originalmente, à sua comunhão direta e pessoal com o divino. Não somente os fundadores sobre- humanos, o Cristo, o Buda, Maomé, mas todos os instituidores de seitas cristãs estão nesse caso; de modo que a religião pessoal deve ainda parecer primordial até aos que continuam a julga-la incompleta.
(...)
A religião, por conseguinte, como agora lhes peço arbitrariamente que aceitem, significará para nós os sentimentos, atos e experiências de indivíduos em sua solidão, na medida em que se sintam relacionados com o que quer que possam considerar o divino. Uma vez que a relação tanto pode ser moral quanto física ou ritual, é evidente que da religião, no sentido em que a aceitamos, podem brotar secundariamente teologias, filosofias e organizações eclesiásticas
.”[1]

A “religião pessoal” caracterizada pelo autor, da qual a alquimia medieval, com as devidas reservas pode ser interpretada como um dos seus mais relevantes exemplos, pressupõe um estado de espirito onde a “ilha egóica” é transcendida pelo “continente inconsciente”. O arrebatamento pela intuição do infinito conduz a realidade psicológica do invisível, a experiência “redentora” do self que, devo dizer, vai muito além da cristalização de qualquer dogma ou da adesão mecânica a uma “comunidade do espirito”. Trata-se obviamente de uma gnose ou de uma opus.
Inspirando-me em JUNG, diria que a aventura espiritual do nosso tempo consiste na entrega da consciência ao indeterminado e indeterminável da psique. Esta é por natureza uma experiência pessoal na qual o indivíduo confronta-se involuntariamente com as representações primordiais da alma coletiva. Ela compreende, em outras palavras, a busca e realização em cada pessoa de uma individualidade psicológica, a uma auto descoberta de si mesmo como totalidade e unicidade.
Assim como através do corpo introjetamos psicologicamente o mundo exterior e físico, através de nossas fantasias religiosas, sejam laicas ou sacras, apreendemos o mundo interior da psique. Como conclui WILLIAM JAMES:

“ Segundo a minha maneira de ver, o modo pragmático de considerar a religião é o mais profundo. Dá-lhe corpo assim como lhe dá alma, fá-lo reivindicar para si, como tudo o que é real precisa reivindicar, algum reino característico de fatos. O que são os fatos mais caracteristicamente divinos, independentemente do influxo real de energia no estado de fé e no coração, não sei. Mas a super crença à qual estou pronto para aventurar-me pessoalmente é que eles existem. Toda a corrente da minha educação tende a persuadir-me de que o mundo da nossa consciência presente é apenas um dentre os inúmeros mundos de consciência que existem, e que esses outros mundos devem conter experiências providas também de um significado para a nossa vida; e que embora tais experiências e as experiências deste mundo sejam discretas, em certos pontos se tornam contínuas, e energias mais elevadas filtram-se até nós.”[2]

O mundo da consciência demarcado pelo pensamento religioso, desde a decadência da influência da Igreja Católica de Roma sobre a cultura ocidental, pode-se dizer, iniciada com as heresias do século XII, consolidada com a Reforma Protestante e recentemente complementada pelo refluxo de todas as religiões institucionais frente ao desafio do deslocamento da identidade do indivíduo, tema corrente entre os autores ditos “pós-modernos”, parece apontar para afirmação crescente da religiosidade como uma experiência cada vez mais pessoal e subjetiva. O protestantismo e posteriormente o esoterismo do século XIX, cujas marcas são claras na poesia de um Baudelaire, de um Gerald de Nerval ou de um Willian Blake, anunciam inequivocamente uma profunda transformação do relacionamento existente entre o indivíduo e o sagrado cujas proporções não podem ser esgotadas neste breve ensaio. Não seria, entretanto, precipitado toma-la como uma possível redescoberta do indivíduo e redimensionamento da consciência do coletivo. Falar sobre isso significaria, entretanto, extrapolar os limites da ciência e mergulhar no pântano escuro das especulações subjetivas, caminho que aproximaria as ciências humanas da categoria de arte, de criação.

[1] William James. As variações da experiência religiosa. Um estudo sobre a natureza humana. SP: Cultrix, 1991, p32.
[2] Ibidem , p. 320.

LOVE


“Tudo me gira em torno.
A expectativa me faz sentir
Vertigens.
O deleite imaginário é de tal modo
Doce
Que me encanta os sentidos”

Shakespeare. Tróilo e Cressida.
III : ii


O amor se faz em sangue
E carne
No buscar ingrato do desejo
Pelo outro de si mesmo.

É um jogo estranho
Entre presença,
Ausência
E eternidade
Em aprendizados de alteridades.

O amor é um encontro
De duas bélicas vontades
Na intensidade da vida
E encanto de naturezas.

ACROSS THE RAIN

As inércias de um dia chuvoso
Decoram os pensamentos,
Inspiram magias.

Deixo-me estático
Entre ruínas de memória
E rascunhos de futuros abandonados
Vislumbrando horizontes perdidos.

Deito-me sobre a chuva
E esqueço-me em sua música
Como quem sabe
Todo futuro da humanidade.

I felt weak.
I could no longer stand.
It’s late.
I am tired...

I fell...

PRAZER E CONTEMPORÂNEIDADE: O IMPERATIVO DO TEMPO PRESENTE


Independente do seu status social, no mundo contemporâneo cada indivíduo está em maior ou menor medida predisposto a buscar aquele estranho estágio de realização pueril de pequenos prazeres que, na falta de palavra melhor, chamaria de “boa ou doce vida”.
A economia dos prazeres diários tornou-se realmente um dos mais significativos aspectos do comportamento humano a ponto de moldar a face de qualquer centro urbano, mesmo que de médio porte.
Através de restaurantes, lojas de departamento, motéis, locadoras de vídeo, cinemas, etc. desenha-se uma verdadeira geografia dos pequenos prazeres das quais absolutamente não se pode escapar. Até mesmo os ambientes domésticos e públicos são cuidadosamente moldados para ser “confortáveis”, produzir “relaxamento”, funcionalidade , ou em outras palavras, despertar prazer.
A onipresença e onipotência do prazer é algo de que absolutamente não se pode duvidar na medida em que já nos tornamos conscientes de que o desejo é a premissa elementar de nossa condição humana.
Em outras palavras, ser é desejar, é existir através dos múltiplos objetos de um querer permanente e sem limites que jamais será plenamente satisfeito.

A desconstrução das antigas metafísicas que sustentavam uma imagem de mundo fundada em referencias de ordem, morais universais e teleologias totalitárias de significados , pressupôs a ascensão do imanente, do “concreto imediato” e do efêmero ao centro de nossas consciências de mundo e realidade. Agora vivemos radicalmente em função do presente e seu sensualismo mas do que dos sonhos infantis de eternidades.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

KLAXONS: MYTHS OF THE NEAR FUTURE


http://www.myspace.com/klaxons


Lançado em Janeiro de 2007 'Myths Of The Near Future', primeiro álbum do Klaxons, uma das melhores bandas inglesas surgidas nos últimos tempos, já pode ser considerado um verdadeiro clássico do rock.
O trio londrino, formado por Jamie, James e Simon em 2005 e cuja carreira despontou com o single Gravity's Rainbow", revelando uma musicalidade profundamente original e uma imagética neo psicodélica. Nada surpreendente para uma banda que definitivamente reinventou a musica eletrônica e o velho rock’roll no Reino Unido.
O significado do nome da banda é bastante curioso. A palavra Klaxons significa “Buzina de automóvel” .Vale lembrar que a primeira revista modernista a ser publicada no Brasil adotou tal nome e as seguintes palavras do editorial do seu primeiro número, com as devidas adaptações, serviria muito bem para inspirar apresentações dessa fascinante banda britânica meta psicodelica:

"Klaxon sabe que a vida existe. E, aconselhado por Pascal, visa o presente. Klaxon não se preocupará de ser novo, mas de ser atual. Essa é a grande lei da novidade.(...)Klaxon sabe que o progresso existe. Por isso, sem renegar o passado, caminha para adiante, sempre, sempre. (...) Klaxon não é futurista.Klaxon é Klaxista.(...)Klaxon cogita principalmente de arte. Mas quer representar a época de 1920 em diante. Por isso é polimorfo, onipresente, inquieto, cômico, irritante, contraditório, invejado, insultado, feliz."

DELICADA QUIMERA


Todo tempo é futuro
Entre lutos e urros
No crepúsculo
De passados mudos
E ilusões de pensamento.

È ao por do sol
Que os amanhãs se reinventam
Para nutrir a noite
Embalando alvoradas incertas
Dentro de um tempo entre aberto.

Mudanças são
Como crianças inquietas
Vestidas de esperança
Sobre um céu desperto.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

LITERATURA INGLESA XXXIX


“Os conceitos da vida e do mundo que chamamos "filosóficos" são produto de dois fatores: um, constituído de fatores religiosos e éticos herdados; o outro, pela espécie de investigação que podemos denominar "científica", empregando a palavra em seu sentido mais amplo. Os filósofos, individualmente, têm diferido amplamente quanto às proporções em que esses dois fatores entraram em seu sistema, mas é a presença de ambos que, em certo grau, caracteriza a filosofia.”


Bertrand Russel- A Filosofia entre a religião e a Ciência in História da Filosofia Ocidental


Nascido no País de Gales, o filósofo Bertand Russel (1872-1970) merece sem sombra de duvidas um lugar privilegiado em qualquer panorama da literatura de língua inglesa. Não por acaso recebeu o Nobel de literatura em 1950. Embora consagrado no campo da filosofia pelos seus estudos sobre lógica e matemática, ao lado do amigo Aldous Huxley, Russel foi antes de tudo um grande ensaísta e humanista, um típico intelectual do século XX, ou seja, um escritor profundamente atento aos problemas e desafios do seu tempo e embalado por uma demasiada confiança na racionalidade humana. Fato comprovado por sua militância anti-nuclear em tempos de guerra fria inspirada por sua vivencia da barbárie de duas guerras mundiais.
Pretendo aqui apenas comentar um de seus ensaios ainda hoje mais populares: What I Believe.

Alan Ryan, professor de ciências políticas e diretor do New College da Universidade de Oxford, nos oferece na apresentação que faz a obra a seguinte e esclarecedora contextualização:

“ No que acredito foi inicialmente publicado em uma série de livros muito curtos- os editores os chamavam de “panfletos”- intitulados “Today and Tomorrow” ( Hoje e Amanhã). Eram livrinhos sobre assuntos os mais variados: “o futuro das mulheres, guerra, população, ciência, máquinas, moral, teatro, poesia, arte, musica,sexo, etc.” Dora Russel escreveu Hypatia para defender a libertação das mulheres, e Russell escreveu dois panfletos para série, dos quais No que acredito foi o segundo. Dedalus, de J.B.S. Haldane, havia oferecido uma visão otimista do que a ciência faria pela humanidade no futuro; Hussell replicou com Icarus, para mostrar que o filho de Dédalo, aprendeu a voar, mas não a voar de um modo inteligente. Já que a ciência enquanto fruto da inquirição racional do mundo poderia apenas nos dizer como atingir nossos objetivos, era de se esperar que o mais impressionante resultado do avanço científico seria transformar a guerra em um massacre de proporções globais. Se evitássemos tal destino, nós nos veríamos ou entediados à morte- na medida em que a burocracia em larga escala tomou as rédeas do mundo- ou seriamos transformados nas dóceis criaturas imaginadas no Admirável Mundo Novo de Huxley- livro provavelmente inspirado pelo Icarus de Russel-, geneticamente programadas para desempenhar nossos papéis sociais e alimentadas com drogas que conseguiriam realizar qualquer coisa que a eugenia já não o tivesse.”


( Bertrand Hussell. No que acredito/ tradução de André de Godoy Vieira. Porto Alegre: L&PM Editores, 2007, p. 17-18 )


A critica a religião levada a cabo por Hussel em “No que Acredito” fundamenta-se em uma defesa otimista da racionalidade e do desenvolvimento cientifico, adota uma retórica oposta a do seu Icarus, que chama atenção para as possibilidades sombrias desse mesmo desenvolvimento cientifico. Logo a contraposição entre fé e ciência que aqui aparece como premissa desse ensaio, e também é evidente em outros momentos da vasta obra do autor, como por exemplo, em “A conquista da Felicidade” ou “Ensaios Ceticos”, presupõe algo mais do que um mero antagonismo ou dualismo. Na verdade o que está em jogo é um redimensionamento dos sistemas de crenças humanas a partir de uma constatação do quanto o significado da existência e do próprio mundo, para o bem e para o mal, é uma construção humana. È nesse sentido que em dado momento da obra aqui discutida ele afirma:

“....No mundo dos valores, a natureza em si é neutra- nem boa nem ruim, merecedora nem de admiração nem de censura. Somos nós quem criamos valor, e são nossos desejos que o conferem. Desse império somos reis e de nossa realeza nos tornamos indignos se à natureza nos curvamos. Estabelecer uma vida plena cabe portanto a nós, e não natureza- nem mesmo à natureza personificada como Deus.”

( Bertrand Hussell. No que acredito/ tradução de André de Godoy Vieira. Porto Alegre: L&PM Editores, 2007, p. 41 )

A crença de Russell nas potencialidades humanas e no predomínio de uma orientação racional da existência individual e coletiva revela sua grande e generosa aposta, enquanto pensador e intelectual engajado, em um potencial progresso da vida e da sociedade. Considerando, entretanto, os desafios que se apresentam ao destino humano nesse inicio de milênio, é significativo especular quanto à atualidade do pensamento de Russell no que diz respeito ao seu apego a uma positividade da razão e da racionalidade, mesmo que em sua filosofia a razão subordina-se ao desejo como essência da condição humana. Afinal, até que ponto a transfiguração da razão, o deslocamento de todos os valores e referências construídas pelo espírito moderno, não nos lança hoje a incerta aventura de deslocar o humano do centro do seu próprio mundo, a uma superação positiva de todo o humanismo?

NOW II

O desbotado instante
Desse agora
É menos que nada,
Não possui passado
Ou presente,
Nem vale a pena
A memória.

Lá fora as horas avançam,
Fatos decoram um dia chuvoso
Enquanto segue indiferente o mundo.

Mas pálido e estático
Em qualquer canto de alma
Um sonho dorme e sonha
O abstrato instante
Desse agora...

sexta-feira, 21 de novembro de 2008

OF A' THE AIRTS THE WIND CAN BLAW...



Direção alguma é segura
No seguir da vida,
Nenhuma certeza é mais confiável
Que um golpe de acaso
Entre os fatos cotidianos.

Todo destino é
meu eu revelado
Entre as ruínas do desconhecido,
Não importa o caminho...

Apenas sigo por ai
Sem direção precisa...
Of a’ the airts the wind can blaw...

Sei a liberdade dos espaços
Abertos em labirintos,
Sei o espelho vazio
Diante do meu próprio rosto.

Of a’ the airts the wind can blaw...

THE FRATELLIS


Fundada em 2005, a banda escocesa The Fratellis, composta pelo trio Jon Fratelli (guitarra/vocais), Barry Fratelli (baixo) e Mince Fratelli (bateria, backing vocals), mesmo tendo lançado até o momento apenas dois albuns Costello Music e Here We Stand , figura no cenário do rock britânico contemporâneo como uma das mais promissoras e criativas bandas surgidas nos últimos anos.
Sua musicalidade transmite descontração e lirismo claramente influenciado por certa leitura dos Beatles, embora possua também uma batida inconfundivelmente pós punk. Em linhas gerais, a leveza de suas melodias e letras despretensiosas nos oferecerem o melhor do velho rock ‘n roll em uma boa roupagem contemporânea. Os mais moralistas podem considerar, obviamente, a temática de suas letras picantes, geralmente eróticas, “depravadas”ou “vazias”. O que, do ponto de vista do Rock, enquanto estilo cultural e movimento social, não tem a minima importância. Eu, particularmente, tomo a tematica de suas letras como irreverente expressão de descreta rebeldia e uma divertida apologia da vida em toda sua intensidade sensualista e concreta.
Dado meu especial carinho por essa banda britânica, sou suspeito para afiançar seu valor e importância. Mas é possível ouvi-la em sua pagina no My space ( http://www.myspace.com/) e melhor conhecê-la através de seu site ( http://www.thefratellis.com/)

CRÔNICA RELÂMPAGO XLI


Estou decididamente entre aqueles que pensam que a conquista da panacéia de um mundo de algum modo melhor ou perfeito seria um verdadeiro desastre, a doentia materialização de qualquer versão de felicidade coletiva arbitrariamente concebida por alguns e imposta a todos em ilusões de universalismos.
Afinal, existem potencialmente tantos mundos perfeitos quanto pessoas no mundo e nenhuma utopia poderia ser uma representação unânime de uma realidade ideal.
A verdade é que não concebo outra dinâmica para o existir coletivo do homem que não passe pela imperfeição e o conflito, onde não existam injustiças, crimes, dramas pessoais, desassossegos de toda natureza e incertezas quanto ao dia seguinte. De outra forma não seriamos humanos, pois se existe algo que possamos definir como humanidade, uma de suas premissas é certamente não se definir pelo primado de virtudes idealizadas ou imperativos categóricos. Não existe, em outros termos, um “bem” ou um “mal” pré determinados entre os quais apenas temos de escolher.
Aliais, fazer escolhas é diferente de dar respostas; essencialmente o que fazemos o tempo todo é formular respostas aos conflitos e problemas cotidianamente vividos a partir dos parcos recursos da consciência, respostas estas que não são pré determinadas, são construções, elaborações que se fazem em nós no calor das emoções, acontecimentos e atos. Quanto mais e melhor somos capazes de lidar com nos mesmos e com os outros, com as desarmonias e conflitos inerentes a existência, menos somos vitimas da ditadura de nossas certezas e sonhos infantis de realidades perfeitas...

PHOTOGRAPHY

Algumas fotografias
São mais que o revelar-se
De um momento capturado,
Dizem mais que a imagem estática,
Prisioneira de eternidades,.
Guardam algo vivo
No dizer de cores,
Rostos e paisagens.

Algumas fotografias
São essencialmente
O próprio tempo presente,
A janela de um AGORA
Do qual nos perdemos
Nas ilusões do tempo.

domingo, 16 de novembro de 2008

C. G. JUNG E A VIDA APÓS A MORTE


A obra epistolar de C. G. Jung não é de forma alguma menos interessante do que seus trabalhos científicos. Pelo contrário, nos permite melhor compreende-los, o que torna justificável a reprodução aqui de uma de suas missivas que aborda especificamente a posição do autor em relação a um tema espinhoso como a vida após a morte... Não temos aqui a posição de um místico, mas do adepto de uma imagem de ciência que transcende o mito da própria ciência através do racional, questionando toda noção de verdade...

“A uma destinatária não identificada
Luxemburgo
30.05.1960


Minha idade avançada e a necessidade de repouso me fazem evitar as muitas visitas e por isso devo limitar-me o quanto possível a respostas por cartas.
Quanto a sua pergunta sobre a vida após depois da morte, posso responder-lhe tão bem por escrito como oralmente. Na verdade, esta pergunta ultrapassa a capacidade da mente humana, que nada sabe dizer que vá alem da mesma. Além disso, qualquer afirmação cientifica é apenas provável. Só é possível formular a pergunta assim: existe alguma probabilidade de a vida continuar após a morte? É fato que- como todos os nossos conceitos- também o tempo e espaço não são axiomas, mas basicamente verdades estatísticas. Evidencia-se assim também que a psique não esta sujeita até certo ponto a estas categorias. Ela é capaz de, por exemplo, de percepções telepáticas e precognitivas. E enquanto isso, ela esta num continuum, fora do espaço e do tempo. Pode-se esperar então que ocorram fenômenos post-mortem que devem ser considerados autênticos. A relativa raridade desses fenômenos sugere em todo caso que as formas de existência dentro e fora do tempo estão de tal forma separadas, que a ultrapassagem desses limites apresenta as maiores dificuldades. Mas isto não impede que paralelamente à existência dentro do tempo corra uma fora do tempo, isto é, que existamos simultaneamente mos dois mundos, tendo as vezes algum pressentimento disso. Mas o que está fora do tempo não pode mudar mais, segundo nossa concepção. Isto tem relativa eternidade.
Talvez a senhora conheça ,meu ensaio “Seele und Tod” no volume Winklichkeit der Seele. Para fundamentação cientifica chamo sua atenção para meu escrito “Sincronicidade: Um principio das conexões acausais” em OC, vol.VIII, p. 437.
Estas são as minhas idéias principais que, oralmente, tembém não exporia de outra maneira.
Com elevada consideração
Sinceramente seu
( C. G. Jung). “

( Cartas de C.G. Jung: Volume III, 1956-1961/ editado por Aniela Jaffé em colaboração com Gerhard Adler; [tradução de Edgar Orth].- Petrópolis: Vozes, 2003, p. 256-257)

O MAIS BANAL E TRANSFORMADOR DA VIDA


Amo o contraste
Entre o azul profundo do céu
E a rua em frenético movimento
De pessoas e coisas
Banhadas por um sol brando
De tarde em morte e serenidade.

Amo o vento macio,
Frio e leve,
Que embala as pequenas sensações
Dos mais simples atos
Dos fatos ordinários de simplesmente viver.


Amos sem sentimento
O ócio profundo
Que foge ao tempo
E se perde
No acontecer breve
De um pequeno e superficial momento
Sem grandes acontecimentos.

sábado, 15 de novembro de 2008

CONHECIMENTO CIENTIFICO E SUBJETIVIDADE

A especificidade do discurso científico é definida tanto a partir de critérios como coerência, consistência, originalidade e objetivação, quanto pelo paradigma da alteridade. O estatuto de verdade, ou a construção do consenso científico, pressupõe persuasão e legitimação coletiva. Neste sentido, sua premissa básica é a universalidade.
Todavia seria um grave equívoco reduzir o discurso científico a mera combinação de critérios internos e externos pois tanto no que diz respeito a sua estrutura e a sua finalidade, o que predomina é o esforço subjetivo de um pesquisador individual que procura traduzir sua experiência singular em termos objetivos ou socialmente estabelecidos por convenção. Não se trata de assimilar e utilizar uma “técnica” pré-determinada e por si mesma inequívoca. Diante da pluralidade do saber científico nas ciências sociais, no que diz respeito a metodologia e referencias ideologicas, nada mais natural do que reconhece-lo como um complexo jogo de opções e escolhas que pré condicionam o olhar de qualquer pesquisador.
Não seria incorreto afirmar que o estudo dos métodos de pesquisa no campo da epstemologia conduz paradoxalmente tanto a uma afirmação quanto um questionamento do estatuto do conhecimento formal. Cabe lembrar que a partir das primeiras décadas do século XX as chamadas ciências humanas, ou como se prefere hoje, ciências sociais, no que diz respeito ao método e aos critérios de verdade, começaram a distanciar-se abertamente dos modelos tomados de empréstimo das ciências naturais.
Desta forma, gradativamente surgiram inúmeras possibilidades novas de legitimação e representação do discurso científico. Basta pensar na contribuição de tendências do pensamento científico como as representadas pela fenomenologia, a hermeneutica ou a semiótica e, no que diz respeito mais especificamente as ciências históricas, a profunda redefinição do conceito de fontes e documentos iniciada pela chamada Escola dos Analles.
Como bem observa LUCIEN GOLDMAN,
“As ciências históricas e humanas não são pois, de uma parte, como nas ciências físico químicas, o estudo de um conjunto de fatos exteriores aos homens, o estudo de um mundo sobre o qual recai sua ação. São ao contrário a análise dessa própria ação., de sua estrutura, das aspirações que a animam e das alterações que sofre.”[1]

Desta subjetividade elementar que define o objeto das ciências humanas, ou seja, o próprio universo humano em suas tantas manifestações simbólicas como a cultura, a sociedade, a religião, a arte, o direito, etc. deduz-se a inadequação da lógica formal como fundamento metodológico da construção do conhecimento científico.
Recorrendo novamente a GOLDMAN é justo lembrar que,
“O processo do conhecimento científico é ele próprio um fato humano, histórico e social; isso implica, a identidade parcial entre o sujeito e o objeto do conhecimento. Eis porque o problema da objetividade se coloca diferentemente nas ciências humanas e na física ou na química.”[2]

Em outras palavras, entre a pesquisa no campo da química ou da fisiologia e a pesquisa no campo das ciências sociais há uma diferença de natureza que demonstra claramente os limites do método empírico dedutivo e a chamada lógica formal, ainda hoje, apesar de muitas resistências, adotada no campo das ciências sociais de forma indiscriminada e mecânica. Neste ponto GALVANO DELLA VOLPE nos permite ir um pouco mais longe através de sua crítica ao positivismo lógico. Segundo ele,
“ A principal dificuldade em fazer-se uma idéia adequada e fornecer um juizo crítico completo da lógica formal moderna ou lógica formalizada (=formalista), propugnada pelo positivismo lógico, reside na sua natureza una-dúplice de teoria do pensamento e teoria da linguagem: pelo que, quando se encarou a primeira teoria e se demonstrou a sua capacidade para valer como lógica tout court ou lógica filosófica ( como se vê ad oculos no problema por resolver da lei científica), resta enfrentar a Segunda enquanto semiótica (Carnap) demasiado abstrata ou parcial, que, na sua peculiar obsessão pela linguagem “correta” ou linguagem da “verdade”, dogmatiza uma linguagem meramente técnica(de tipo matemático), falhando como semiótica(ou semântica) geral, verdadeiramente filosófica.” [3]

O equacionamento da linguagem técnica e a interpretação, problemática que nos é aqui muito bem apresentada pelo autor, é um dilema que vivenciamos inevitavelmente quando nos lançamos a árdua tarefa de formular um projeto científico e desenvolver uma pesquisa. Não existem no que diz respeito a isso respostas prontas ou acabadas. Como o próprio conhecimento científico esta é uma questão em eterna construção e reconstrução. Só podemos, de acordo com nossas opções subjetivas, lhes proporcionar as respostas que o nosso presente e nossa referências permitem.

[1] GOLDMAN, Lucien. Ciências humanas e Filosofia. SP: Difusão Européia do Livro, 1967; p.27.
[2] Ibidem
[3] DELLA VOLPE, Galvano. A lógica como ciência histórica. Lisboa: Edições 70; s/d; p.242 et seq.

PÓS IDENTIDADE

A vida corre sem pressa
Pelo abstrato do tempo
Dizendo-se em dias e noites.

Segue aleatoriamente
Pelo acumulo dos fatos
Enquanto persigo
A mim mesmo
No não ser dos pensamentos,
No não saber dos sentimentos
Que escapam ao tumulto
Das emoções mais cruas..

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

HANNAH ARENDT: ENTRE A DECADÊNCIA DO ESPAÇO PÚBLICO E INDIVIDUOS EM TEMPOS SOMBRIOS


Considero a coletânea de ensaios HOMENS E TEMPOS SOMBRIOS de Hannah Arendt um de seus livros mais curiosos por nos proporcionar uma valiosa reflexão sobre o lugar do individuo no contexto de decadência do espaço público que, dentre muitas outras coisas, caracteriza nossa contemporaneidade.
A própria autora, no prefacio que faz a obra, elucida o significado dos tempos sombrios a que se refere e que, evidentemente, associa-se a experiência dramática das duas Guerras Mundiais e do totalitarismo
.
“ ... Fui buscar a expressão ao famoso poema de Brecht “Aos que virão a nascer” , que fala da desordem e da fome, dos massacres e dos assassinos, da revolta contra a injustiça e do desespero “ quando só havia injustiça e não revolta”, do ódio legitimo que no entanto nos desfigura, da cólera justificada que nos enrouquece a voz Tudo isso era bem real, uma vez que se passava em público; não era nem segredo nem mistério. E todavia, nem por sombras estava ao alcance de todos os olhos, era difícil ter-se consciência da situação; pois até ao último momento, em que a catástrofe arrastou tudo e todos, ela foi sempre camuflada, não por realidades mas pelos muito eficientes discursos e pelo palavreado de quase todos os representantes oficiais que, ininterruptamente e com as mais engenhosas variantes, iam arranjando explicações para todos os fatos desagradáveis e para todas as preocupações justificadas. Quando pensamos nos tempos sombrios e nas pessoas que neles viveram e se movimentaram, temos que levar em linha de conta esta camuflagem, emanada do “poder estabelecido”- ou do “sistema”, como então se dizia- e por ele difundida. Se a função do domínio público é iluminar a vida dos homens, proporcionando um espaço de aparências onde eles podem mostrar, em palavras e actos, para o melhor e o pior, quem são e o que sabem fazer, então as trevas chegam quando esta luz se apagada pelas “faltas de credibilidade” e pelo “governo invisível”, pelo discurso que não revela aquilo que é, preferindo escondê-lo debaixo do tapete, pelas exortações, morais e outras,k que a pretexto de defender velhas verdades degradam toda a verdade, convertendo-a em uma trivialidade sem sentido.”

( Hannah Arendt. Homens em tempos sombrios. Tradução de Ana Luisa Faria. Lisboa: Relógio D’agua, 1991, p.8 )

Esta é a temática que entrelaça os 11 ensaios da coletânea sobre a biografia de indivíduos que viveram nesses tempos sombrios de séc. XX, com exceção de Lessing, e que são tão diferentes um do outro e, em alguns casos, realmente antagônicos. Afinal Arendt toma por objeto a vida de homens com,o Ângelo Guiseppe Roncalli, Isak Dinesen, Randall Jarrell, Karl Jaspers, Hermann Broch, Walter Benjamin, Bertolt Brechtn e Rosa Luxemburgo.

Uma passagem do ensaio sobre Lissing, que abre o livro, me parece particularmente interessante para apresentar as idéias que perpassam esta coletânea tão original:

“Nada em nosso tempo é mais duvidoso, penso eu, do que a nossa atitude para com o mundo, nada menos garantido do que o acordo, que uma distinção nos impõe e que a sua existência afirma, com aquilo que se manifesta em público. No nosso século até mesmo o gênio só se conseguiu desenvolver em conflito com o mundo e o domínio público, embora naturalmente encontre, como sempre fez, a sua forma própria de acordo com o seu público. Mas o mundo não é a mesma coisa que as pessoas que o habitam. O mundo está entre as pessoas, e este espaço-entre é hoje- muito mais do que os homens, ou mesmo o homem, ao contrário do que muitas vezes se pensa- o objeto das maiores preocupações e o domínio das convulsões mais evidentes em quase todos os paises do globo. Mesmo onde o mundo ainda se encontra numa relativa ordem, ou é mantido numa relativa ordem, o domínio público perdeu a capacidade de iluminação que originalmente fazia parte de sua natureza própria. São cada vez mais os habitantes dos paises do mundo ocidental, que desde o declínio do mundo antigo considerou a liberdade em relação à política como uma das suas liberdades fundamentais, a exercer esta liberdade, retirando-se do mundo e das suas obrigações para com ele. Este alheamento do mundo não prejudica necessariamente o indivíduo; até pode permitir-lhe cultivar grandes talentos, elevando-o ao grau de gênio, e por esse desvio o tornando uma vez mais útil ao mundo. Mas com cada um desses alheamentos verifica-se uma perda quase palpável para o mundo; o que se perde é o espaço- entre particular e geralmente insubstituível que deveria ter-se criado entre esse individuo e seus semelhantes.”

( Hannah Arendt. Homens em tempos sombrios. Tradução de Ana Luisa Faria. Lisboa: Relógio D’agua, 1991, p. 12-13 )

quinta-feira, 13 de novembro de 2008

LIFE II

Vivo apenas
Do dia, da noite e do acaso
Nos labirintos da embriagues
De um céu negro e distante.

Vivo na violência do vento,
No corpo das tempestades
Que procuram madrugadas
Nos intervalos da vida.

Vivo da violência
De um encanto de existências
Cravadas no peito
Da própria e cotidiana
mera realidade.

quarta-feira, 12 de novembro de 2008

SOBRE A UTOPIA de T. MORE


Publicado originalmente em 1516, justamente um ano antes da eclosão da reforma luterana, A Utopia de More permanece ainda hoje um texto um tanto quanto enigmático. Responsável pela invenção da palavra Utopia, não raramente é vitima de leituras anacrônicas e “ideolocizantes” sobre seu significado enquanto “critica social e política” à Inglaterra dos Tudors através da idéia de uma sociedade ideal comunista.
A Utopia de More insere-se, entretanto, no panorama humanista e renascentista, constitui um esforço de conciliação entre a cultura clássica e medieval mediante a um reequacionamento entre o paganismo pagão da antiguidade com o cristianismo medieval, o que se expressa, por exemplo, na valorização do epicurismo presente na obra, mesmo que contraditoriamente diluído por certo estoicismo.
A republica de Utopia expressa o desejo do autor por uma reforma da vida social e política da Europa do séc XVI como uma resposta a então evidente crise da cristandade ocidental.
Para o historiador Carlo Ginzburg, em uma leitura realmente original construída através de sua micro- história, conforme sugerem alguns indícios pouco observados na obra, a Utopia de More insere-se em uma tradição literária satírica que remonta a Luciano de Samósata.
Em suas próprias palavras:

“Greenblatt decerto tem razão em sustentar que a maioria dos interpretes deixou escapar “ a sensação de perspectivas incompatíveis” que tem tamanha importância no livro de More. Mas esse elemento formal, por importante que seja, pode ser identificado como o núcleo do livro?
A abordagem que proponho ultrapassa esse dilema, uma vez que leva em conta as “perspectivas incompatíveis” que Greenblatt ressalta, como também o “complexo enquadramento” que os interpretes debateram longamente. No centro deste último debate está a tese de Hexter sobre o “parágrafo fora do lugar”, segundo a qual o parágrafo do livro primeiro da Utopia que promete uma descrição da ilha seria uma espécie de “remedo”, indício mal escondido de uma fase anterior do projeto de More, visto que a descrição só comparece no livro segundo. No entanto, quando se lê a Utopia no contexto da tradição luciânica, tão dada a contradições lógicas e textuais, a tese de Hexter parece muito frágil. “Mas contarei as minhas aventuras no outro continente no próximo livro”, lê-se no fim do segundo e último livro de Uma história verdadeira, de Luciano. “A maior mentira de todas”, comentou secamente um escriba grego, à margem da cópia.
Outro estudioso, G. M. Logan, declarou que a influência de um escritor satírico como Luciano seria incompatível com as passagens “absolutamente sérias da descrição de Utopia”. O livro de More, adverte Logan, “apesar de ser escrito de forma arguta e indireta, é uma contribuição séria à filosofia política. Mas os elementos sérios e cômicos da Utopia serão tão opostos assim? Ao rejeitar esse dilema, Thompson perguntou-se: “ Não poderíamos ficar com as duas alternativas?Cero, mas como? O que está em pauta é a relação entre as duas faces do livro. “Apesar de ser escrito de forma arguta e indireta”, escreveu Logan; eu não diria “apesar”, e sim “por ser escrito”. Como se sabe, More começou a escrever pelo que viria a ser o livro segundo, isto é, a descrição de Utopia; em seguida, acrescentouo livro primeiro, a descrição da Inglaterra. Tenho a impressão de que, neste caso, post hoc e popter hoc coincidem. Os paradoxos de Luciano devem ter descortinado a More um campo de possibilidades que modificou o seu projeto original. Hipóteses extravagantes e puramente imaginárias levaram-no a contemplar a realidade de um ponto de vista insólito, a fazer perguntas obliquas à realidade. O que aconteceria se ( como imaginou Luciano) as várias filosofias fossem a leilão? O que aconteceria se a propriedade privada fosse abolida? Antigos rituais de inversão como as saturnais levaram More a imaginar uma sociedade fictícia, na qual ouro e a prata eram usados para fabricar penicos e os embaixadores estrangeiros carregados de correntes de ouro, por engano, eram tidos por escravos. Os mesmos rituais de inversão, ajudaram-no a entrever pela primeira vez uma realidade paradoxalmente às avessas: uma ilha em que as cabras devoravam os homens.”

Carlo Ginzburg.O Velho e o Novo Mundo vistos de Utopia, in Nenhuma ilha é uma ilha. Quatro Visões da literatura Inglesa/ tradução de Samuel Titan Jr. SP: Companhia das letras, 2004, p. 41-42

LITERATURA INGLESA XXXVIII


Alfred Edward Mason (1865-1948) no cenário da literatura britânica, é um nome relativamente pouco conhecido, embora tenha escrito cerca de trinta peças literárias. A mais conhecido dentre elas é o romance The Four Feathers ( As Quatro Penas Brancas) originalmente publicado em 1902 e, diga-se de passagem, imortalizado por cinco versões cinematográficas, dentre as quais a mais popular e bem sucedida foi a de 1939 dirigida por Zaitan Korda.

Este belo romance nos oferece um significativo panorama da paisagem cultural correspondente ao mundo da antiga aristocracia britânica e seu ethos militarista, rigidamente hierárquico e vinculado à afirmação do império colonial britânico.
Ao longo da narrativa articulam-se em torno da questão da honra uma serie de conflitos de valores que basicamente contrapõem o individuo aos crivos impostos pelo meio sócio-cultural. Associado ao tema da honra encontra-se, por exemplo, a questão da relação entre gêneros, com destaque para a problemática do amor entre homem e mulher e o próprio lugar da mulher na sociedade.

Resumindo o enredo, a personagem central, o jovem Harry Fevershun, ao deixar o regimento a que servia as vésperas de sua partida para atuar em um conflito no Sudão, é acusado por seus principais amigos de infâmia e covardia, recebendo no dia de seu noivado três penas brancas simbolizando sua desonra. A estas junta-se uma quarta oferecida por sua própria noiva. Com a desconstrução da sua opção por uma vida domestica e calma, Harry lança-se em segredo a uma perigosa e árdua aventura pela Irlanda, Sudão e Egito, para provar seu valor e recuperar sua honra.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

ENCANTO DE ACASOS

Eu amo o acaso,
Estrelas e fatos
No perde-se de um céu aberto
Em liberdade de atos
E loucuras de imaginações.

Eu amo o infinito e a particularidade desse ato,
Meu ser gente em pluralidades de tempos,
Existências e imaginações.

Eu amo o caótico acontecer
Da liberdade
Em todas as coisas do mundo
Sob um infinito aberto em vida, luz
E azul profundo
Ao sabor do vento.

CRÔNICA RELÂMPAGO XL

Em um determinada e incerta ocasião, ouvi da boca de um velinho uma melancólica argumentação sobre o fato de já ter perdido muitas coisas na vida, a confissão de que já tinha cometido muitos erros e não se importava de viver de ilusões, sonhos e crenças religiosas ou políticas, justamente por não ter mais em que pessoalmente realmente acreditar.
Respondi na ocasião que o que de fato faz diferença em nossas vidas é o modo como enfrentamos a realidade de todos os dias, como confrontamos nossos medos, desejos, frustrações e limites.
Hoje sei que as coisas não são tão simples assim, embora não decline de minha opinião de ocasião. Apenas acho que quanto mais certezas afirmamos para nós e para os outros, mais nos desfazemos em enganos. No presente caso, é fato que, em alguma medida, qualquer um se sente inseguro ou insatisfeito com a própria existência. Na melhor das hipóteses, angustia-se com o natural fato de que um dia ira desaparecer da face da terra como tudo aquilo relacionado a ele ou a seus entes queridos.
Mas é possível ir além desse sentimento. Há algo mais... Algo que diz respeito aquilo que poderíamos provisoriamente definir como “a estética da vida”, a construção subjetiva de significados através de nossa auto expressão mediante empreendimentos pessoais de coisas inúteis e sem importância para o mundo e os outros, mas que de alguma maneira realizam o que somos na medida em que a construímos em árduo processo de auto-expressão irracional e sentido. Pode- se compor uma musica, pintar um quadro, escrever um livro ou simplesmente... viver intensamente a própria vida até o limite de todo acontecimento convencional. O importante é dedicar-se de corpo e alma a alguma coisa que seja pessoalmente significativa, que faça tudo valer a pena.

A PRIMEIRA GRANDE GUERRA MUNDIAL: 90 ANOS DEPOIS...


11 de novembro de 2008 marca 90 anos do fim da Primeira Grande Guerra Mundial. Mas cabe dizer que em agosto de 1914 muitos europeus marcharam para os campos de batalha entre jubilosas manifestações e festas entoando ridículos cantos patrióticos.
As multidões nacionalistas que então agrediam, discriminavam e desconfiavam dos poucos pacifistas da época, não tinham a menor idéia de que nos anos que se seguiriam o ocidente seria palco de horrores nunca antes concebidos. A ciência da guerra unia-se triunfante as políticas nacionais sob o signo do sacrifício, da “Sagração da Primavera”.. .
Noventa anos depois é insólito constatarmos impotentes e perplexos o quanto a guerra e a violência tornaram-se atividades capazes de comprometer o futuro da própria espécie humana pela mera e subjetiva decisão política de Estados... De que outro modo podemos, por exemplo, pensar a ocupação norte americana do bizarro Iraque e as pretenções a conquista da bomba atômica no Irã, na India, Paquistão, etc. sob o fantasma de uma nova "querra fria" multilateral e escalada armamentista?

INDIVIDUALISMO, ALTERIDADE E POS MODERNIDADE

A aceitação do heterogêneo e do marginal, o reconhecimento e integração da diversidade, do hibrido e a conseqüente rejeição das totalidades e totalitarismos morais, dos meta discursos identidários, constituem um dos aspectos mais decisivos do tempo presente, diga-se de passagem, formatado por uma pauta que podemos tomar como “pós- moderna”.
O conseqüente relativismo axiológico, a perda de um parâmetro universal que estabeleça princípios comuns as performances das sociabilidades e intercâmbios humanos, a eleição da alteridade como referencial e premissa de uma Ética contemporânea, simboliza a recusa e contra-posição ao “neo conservadorismo” dos defensores do retorno a uma moral e valores tradicionais como desesperada busca de segurança e certeza frente uma realidade cada vez mais ilegível.
O mundo em que vivemos já não é mais o mesmo que o dos nossos pais ou avós, se quer podemos chamá-lo de “nosso” sem ariscar a autenticidade de uma pluralidade de possibilidades de mundos dentro de mundos. Afinal, a grande a maravilhosa mudança é que não é mais a sociedade que molda e condiciona o individuo, mas o individuo que molda e relativamente transcende a própria idéia de sociedade...

domingo, 9 de novembro de 2008

POEMA SENSUALISTA

O tempo não passa
De uma convincente ilusão
Na opaca fantasia
Do corpo e da alma
Entre as coisas...

Pois todos os acontecimentos
De uma vida inteira,
Não cabem em um único segundo
De pura eternidade.

Mas quantas eternidades valem
Um mero segundo de absoluto prazer?

Viver é mais importante que eternidades
Quando um único segundo
Dentro da gente
Nunca tem fim...

sábado, 8 de novembro de 2008

VIOLÊNCIA E CONTEMPORÂNEIDADE


Um dos mais curiosos fenômenos que caracterizam a contemporaneidade é o da liberdade da violência enquanto linguagem e modo de expressão de indivíduos, nações e bizarras organizações terroristas. Atualmente, a violência já não é um fenômeno instintivo condicionado a ritualista simbólica, como foi durante as guerras religiosas da Europa no inicio da modernidade, e muito menos uma prática de Estados através da guerra limitada por um rígido código ético como no séc. XIX.
A violência do nosso tempo tornou-se impessoal e incondicionada refletindo assim uma imagem de realidade onde a vida individual revela-se de muitas e ingratas formas um valor relativo frente aos interesses e práticas coletivos.
Quando grupos, sociedades, códigos morais falam mais forte do que o reconhecimento da diversidade e do outro, o uso ilimitado da força é um recurso legitimo tanto para um psicopata quanto um chefe de Estado.
Tudo isso significa que nossas representações da morte estão se modificando ou, para ser mais preciso, se laicizando de um modo que não considerávamos possível.
O celebre historiador britânico Eric Hobsbawn nos ajuda a pensar este espinhoso tema no fragmento abaixo:

“Gostaria de ilustrar a amplitude do abismo entre o período anterior a 1914 e o nosso. Não me apoiarei no fato de que nós, que passamos por desumanidade maior, tendemos hoje a ficar menos chocados com as moderadas injustiças que envergonharam o século XIX. Um erro isolado da justiça na França ( o caso Dreyfus), por exemplo, ou vinte manifestantes presos por uma noite pelo exercito alemão em uma cidade da Alsácia ( o incidente de Zabern em 1913). O que desejo lembrar a vocês são normas de conduta. Clausewitz, escrevendo após as Guerras Napoleônicas, pressupunha que as forças armadas dos Estados civilizados não executariam seus prisioneiros de guerra ou não devastariam países. As guerras mais recentes em que a Grã-Bretânha se envolveu, ou seja, a Guerra das Malvinas e a Guerra do Golfo, sugerem que isso não é mais pressuposto. Além disso, para citar a 11º edição da Enciclopédia Britânica, “a guerra civilizada, dizem-nos os manuais, confina-se, na medida do possível, à incapacitação das forças armadas do inimigo; caso contrário, a guerra continuaria até que uma das partes fosse exterminada. ‘É por um bom motivo”’- e aqui a Britânica cita Vattel, um advogado internacional do nobre Iluminismo do século XVIII- “‘que essa prática passou a ser um costume nas nações da Europa’”. Não é mais um costume das nações da Europa ou de nenhum outro lugar. Antes de 1914, a concepção de que a guerra devia se dar contra combatentes e não contra não-combatentes era uma concepção comum a rebeldes e revolucionários. O programa do Narodnaya Volya, o grupo russo que assassinou o czar Alexandre II, afirmava explicitamente que “indivíduos e grupos alheios a sua luta contra o governo seriam tratados como neutros, sendo suas pessoas e propriedades invioláveis”. Aproximadamente na mesma época, Frederick Engels condenava os fenianos irlandeses ( com quem estavam todas as suas simpatias) por colocarem uma bomba em Westminster Hall, arriscando assim as vidas de inocentes ali presentes. Como um velho revolucionário com experiência em conflito armado, ele achava que a guerra deveria ser movida contra combatentes e não contra civis. Hoje, esse limite não é mais reconhecido por revolucionários e terroristas, como também não o é pelos governos que promovem guerras.
Sugiro então uma breve cronologia dessa escorregada pelo declive de barbarização. São quatro os seus estágios principais: a primeira Guerra Mundial, o período da crise mundial desde o colapso de 1917-20 até o de 1944-7, as quatro décadas da era da Guerra Fria e, por ultimo, o colapso geral da civilização conforme conhecemos sobre sobre extensas áreas do mundo a partir dos anos 80. Há uma óbvia continuidade entre os três primeiros estágios. Em cada uma das lições anteriores de desumanidade do homem para com o homem foram aprendidas e se tornaram a base de novos avanços de barbárie. A mesma conexão linear não existe entre o terceiro e quarto estágios. O colapso dos anos 80 e 90 não se deu graças as ações de agentes humanos de decisão que poderiam ser reconhecidas como bárbaras, como o os projetos de Hitler e o terror de Stalin, lunáticas, como os argumentos justificando a corrida rumo a guerra nuclear, ou ambas, como a Revolução Cultural de Mão. O colapso ocorreu porque os agentes de decisão não sabem mais o que fazer quanto a um mundo qu escapa ao seu ou ao nosso controle, e porque a transformação explosiva da sociedade e da economia a partir de 1950 produziu um colapso e ruptura sem precedentes nas regras que governam o comportamento em sociedades humanas. O terceiro e quarto estágios, portanto, superpõe-se e interagem. Hoje as sociedades humanas estão falindo, mas sob condições em que o padrão de conduta pública permanecem ao nível a que foram reduzidos nos períodos anteriores de barbarização. Até agora não deram nenhum indício significativo de estarem novamente se elevando.”

(Eric Hobsbawn. Sobre História/ tradução de Cid Knipel. Companhia das letras, 1998, p. 270)

MATURIDADE E AFIRMAÇÂO DO INDIVIDUO NO TEMPO DE UM PONTO DE VISTA TOTALMENTE SUBJETIVO

Subjetivamente, considero a maturidade, enquanto meta ideal do desenvolvimento da personalidade humana, como um estado de consciência onde já não somos movidos por grandes paixões, em que não cultivamos grandes fantasias de futuro e ambições maiores do que a permitida pela realidade etérea de todos os dias.
A maturidade é, em suma, um modo de olhar o mundo vivenciar os fatos cotidianos, que pressupõe certo despreendimento e relativa indiferença a todas as coisas.
A maturidade é essencialmente aristocrática... um modo peculiar e impreciso, através do qual aprendemos a lidar com a fatalidade do acaso de nossas diversas e múltiplas individualidades e finitudes...

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

PRESENT...

Ignoro o anonimato do outro,
O universal filosófico,
As paixões de momento,
Em nome de um segredo em movimento,
Da minha individualidade
Em metafísicas laicas em sonhos de liberdade.


O presente
É um eterno estar por vir,
Um constante avançar de futuros
Que se perdem,
Que nascem
Ou não percebemos
Em apoteoses de ansiedades e desejos.

No acontecer do rosto
Nos transformamos neles
Apesar de presos ao tudo igual diário.


Mas a vida é imprevisível
Em cada lance de dados do acaso
E diárias cotas de fantasia.

FREE...

Sou, de algum modo,
Meu próprio lugar no mundo.
Ignoro as caladas paisagens
Da cidade em volta,
Os noticiários nacionais e internacionais
Que pouco me dizem aos sentidos d’alma.

Ignoro o anonimato do outro,
O universal filosófico,
As paixões de momento,
Em nome de um segredo em movimento...
minha individualidade
Ou laica metafísica
De sonhos de liberdade.